Sexta-feira, 11 de Maio de 2012

.Parabéns

Este ano, pela primeira vez, ia ser tão fácil oferecer-te uma prenda de anos. Com tantos concertos bons que por aí vêm, não ia ser nada difícil. Provavelmente, já terias comprado bilhete para todos aqueles que quererias ir ver, mas eu ia contornar isso facilmente, e oferecer-te um castigo bom. Ia obrigar-te a ires a um dos meus. Sei que o teu dia de Rock in Rio seria o de Offspring e amigos, mas lá terias tu de ir ver Bryan Adams comigo. Ou então escolhia um daqueles que quero mesmo ir ver, mas ainda não tive coragem de gastar dinheiro. Lana Del Rey no Meco, Florence and the Machine aqui tão pertinho. Estes iam ser castigos maus para ti. Mas sei que ias aguentar estoicamente. E sei também que quando eu me sentisse cansada voltavas a sentar-te na relva, como tantas vezes, para deixar-me descansar os olhos nos teus ombros. Ou podia apostar numa repetição, e íamos ver Keane, ou Sting. Ia ser tão fácil. Tenho tanta, mas tanta pena que não estejas aqui. Por tantas coisas, pelas pequenas, como estas, também. Parabéns Tuto.

L. às 15:24
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Quarta-feira, 14 de Setembro de 2011

.Contrastes

Ontem foi dia de voltar ao dentista. Contas feitas, tirei o aparelho há oito anos e há mais de dez que pisei aquele consultório pela primeira vez. Acordei cedo para poder ir de comboio, um dos meus pequenos prazeres. De iPod nos ouvidos até entrar na carruagem, e a alternar entre “A vida secreta das abelhas”, da biblioteca de Oeiras, e as vidas que iam ocupando os bancos à minha volta, segui até Entrecampos. Voltei a pôr o iPod e comecei a andar para o fundo – as torres cor-de-rosa eram já ali e a consulta era só às 10:30 – talvez me atendessem mais cedo, pensei. Foi quando vi um casal de velhotes a correr para o comboio, que já tinha fechado as portas e começava a andar nesse instante. Ele ia mais à frente, ela tentava apanhar os dois. Olhei para eles, para os ténis branquinhos nos pés dele – como aqueles que oferecemos nos anos ao avô há tanto tempo e que ele continua a usar como se fossem a coisa mais preciosa deste mundo, e não pude deixar de ver ali, neles, os meus avós. Deu-me tanta pena vê-los assim, a correr, a bater com a mão na porta sem que isso travasse o comboio, que comecei a chorar ali mesmo, enquanto andava. Não sei explicar bem porquê, só senti o coração apertado, e chorei. Chorei por eles. Chorei por mim. Pelos medos, inseguranças, dores, e pelo que o tempo faz. Chorei pelo pai, por vê-lo de muletas, por não lhe poder dar aquilo que merece. Chorei pela mãe, por não poder ajudar a transformar mesmo os sonhos mais pequeninos em realidade. Chorei pela mana, pelas doenças, doencinhas e doencitas que a incomodam sempre. Pelo trabalho que começa agora a procurar, pelo mestrado onde quer entrar. Chorei pela avó T., a ser operada ao olho naquele momento. Pela avó A., com medo que os maus entrem pela casa adentro sempre que está sozinha. Pelo avô Al., ao imaginá-lo orgulhoso no palco a acompanhar as cantadeiras com a gaita-de-beiços. Pelo avô X., que já não está connosco. Chorei pelo actor de Spartacus, que morreu esta semana com a doença do Tuto (chorei por ele também), a mesma que, com a quimioterapia, enfraquece a Ce. de dia para dia. Chorei pelo sr. J.P., a quem o coração quase trocou as voltas e pela Cr., que sofre por isso. Chorei pelo Z., enquanto o imaginava em outros braços a dançar a música que estava a ouvir no momento da mesma forma que o faz comigo. Chorei pela Lily, heroína do livro guardado na mala, que acabava de encontrar May sem vida. Dei por mim a chorar por este mundo e pelo outro, por mim e por todos os outros. Talvez fossem lágrimas acumuladas em tantos dias, que precisavam apenas da mínima faísca para saírem para fora. E o dique rebentou, ali na plataforma de Entrecampos, ao ver o desalento de dois velhotes que acabavam de perder o comboio. Continuei a andar, aumentei o som e esperei que as lágrimas secassem. Só vejo o meu dentista preferido uma vez por ano, não ia receber o “cara linda, cá estás tu outra vez” lavada em lágrimas. Esperei na sala por pouco tempo e entrei para uma repetição destes últimos anos. “Cara linda, cá estás tu outra vez. Sorri. Abre. Fecha. Trinca. Que curso tiraste tu? Jornalismo? Como é que foste para isso? E onde estás agora? Ah, pois é, já não me lembrava. Continuas perfeita, com um sorriso perfeito. Flúor de limão, mentol ou morango? Volta cá daqui a um ano. Gosto em ver-te, cara linda”. E eu saí com o meu melhor sorriso, sem pensar que o mesmo discurso estava já a ser repetido à menina que entrava. Olhei para as horas, 10:37. Corri até ao Campo Pequeno para comprar uma massinha para o almoço e cheguei à plataforma ao mesmo tempo que o comboio – 10:57. Corri, entrei sem saber bem como, percebi que não tinha validado o bilhete, voltei a sair e a entrar e foi quase por milagre que segui viagem. Ou não. Estava tão absorvida na leitura que nem dei conta das pessoas que iam entrando e saindo, nem dos meus companheiros de viagem. Foi só quando a minha paragem se aproximou, e me encaminhei para a porta, que os vi. Não eram os mesmos da manhã, era outro casal de velhotes. Tinham tantos, mas tantos sacos, que não consegui imaginar como tinham chegado até ali. Duas malas térmicas grandes, um saco daqueles enormes de supermercado cheio, e dois carrinhos de compras, um deles bem grande. Tirei os fones, arrumei tudo na mala e fui ter com eles, posso ajudar a levar os sacos? Que sim, que podia, muita obrigada, que talvez o elevador estivesse a funcionar e aí seria mais fácil. Levei-os até lá, e tentei certificar-me de que não precisavam mais de ajuda. Foram tão convincentes que acreditei que alguém estaria lá em baixo à espera deles. Foi só quando desci as escadas e me dirigia para a saída que os voltei a ver, sozinhos, a tentar equilibrar tudo aquilo. Fui a correr, deixe-me ajudá-la, para onde vão? “Deus lhe pague, para o táxi”, dizia-me. Agarrei em dois dos sacos e senti mais uma vez o peso de tudo aquilo – muito mais do que o que estava lá dentro. Isto é muito pesado para si. E ela agarrou-me o braço, que as dores mal a deixavam caminhar, que já tinha caído desamparada no Areeiro e o joelho, negro, aumentava de tamanho e impedia-a de continuar. Ajudei-os a entrar no táxi, com um condutor nada simpático. Ainda ousei pedir-lhe para os ajudar a descarregar tudo o que traziam de outras hortas quando chegassem ao destino, mas o ar dele de espanto não me deixou mais descansada. Acho que ainda nem me tinha despedido deles e já as lágrimas tinham voltado a cair. Pelo peso dos sacos, pelo joelho dorido, pela falta de alguém à espera deles. Por tudo e por nada, pelos males do meu mundo e do mundo dos outros. Segui para o carro, à espera para me levar até ao trabalho, debaixo de um sol que sufocava tanto quanto as lágrimas. Pensei em como estes dias têm sido de contrastes. Passei o domingo na praia, com o Z. e os pais, e não parámos de rir. Das piadas, da cesta da comida, do bronzeado manchado que apanharam os três. À noite, enquanto comíamos choco frito em Setúbal, fomos atacados por uma vaga de mosquitos que nos fez chorar a rir. Ficámos todos picados, mesmo depois de termos morto uns 20. Eu matei três só na testa do pai, o pai batia no Z., a mãe em mim e até derrubei um copo de coca-cola em cima de mim ao tentar acabar com um que me picava o braço. Mal conseguimos comer, entre picadas e gargalhadas, enquanto víamos as outras mesas também neste estranho ritual de agressão aos companheiros de refeição. E ali estava eu, depois de tanto riso, numa crise de choro pela segunda vez no mesmo dia.

Depois de sair do trabalho voltei a Lisboa de comboio. O Z., o Di. e a Ta. esperavam-me para um jantar no Lucca. E aí voltei a rir, muito. A celebrar a amizade, o amor, as coisas boas que a vida também me vai trazendo, regados a chá de jasmim com limão e canela. Liguei aos pais e aos avós, a tentar sossegar o temporal que me tinha apanhado durante o dia, e ainda ajudei a mana a fazer a carta de motivação para se candidatar ao mestrado antes de cair na cama. Adormeci a tentar equilibrar as emoções do dia, a tentar conciliar tantos contrastes. E, tenho a certeza – talvez por não ter mais lágrimas para gastar -, com um sorriso. Aquele que o meu dentista diz que é perfeito.

Sexta-feira, 29 de Julho de 2011

.'Bora lá

Conheci Londres há já muito tempo. Tinha acabado de chegar à escola nova, no 9º ano, quando a professora de inglês nos lançou o convite. Tínhamos tantas tarefas entre mãos (reuniões, angariações de dinheiro, convencer os pais, …), que achei que seria uma missão impossível. Quando dei por mim no avião ao lado do Tuto nem acreditei muito bem. Foi assim que me estreei nas viagens de avião, numa espécie de viagem de finalistas – eu, que era nova ali; com os colegas do 9º ano. Foi uma semana muito intensa. Ficámos divididos em casas de família e logo aí tivemos a primeira surpresa. Os colegas contavam-nos sobre as famílias divertidas que lhes tinham calhado em sorte, com pizas, idas ao cinema, passeios pela cidade. Eu e as minhas três colegas de casa engolíamos em seco: estávamos desterradas num sótão, com cancelas e cadeados em todos os andares, portas com três fechaduras e permissão para entrar apenas em três sítios: quarto, casa-de-banho e copa (nada de levar o prato para a cozinha depois de terminada a refeição, éramos brindadas com um olhar fulminante). Trancávamos a porta também, não fosse o filho da dona da casa – rapaz que se apresentou de toalha à cintura, sem pele que se visse entre tantas tatuagens e piercings, nos atacasse. Pior do que tudo isto era a comida. O nosso primeiro pequeno-almoço resumiu-se a um ovo cozido e uma caneca de chá ou café. Num dos primeiros jantares tivemos de mentir e dizer, no nosso inglês aflito, que já tínhamos comido qualquer coisa na rua: duas batatinhas cozidas às 16:00 (disse ela), uma fatia de queijo e uma de tomate não nos seduziram. E lá veio novo ralhete. Não sabíamos se devíamos chorar ou rir (não percebíamos metade do que dizia, era qualquer coisa como falta de responsabilidade, tinha ela preparado aquilo para nós às 16:00…). E fomos para o castigo, o nosso espaço – ou o único onde podíamos estar longe dela. De Londres recordo bem duas coisas: a amizade que cresceu entre todos, e a falta de sol. Não dava para fazer a fotossíntese, não dava para animar, era um céu carregado em cima de nós dia e noite (acho que ainda hoje vejo no céu de Londres a cara da senhora a ralhar connosco). Lembro-me da visita ao Sega World, da descida rápida num aparelho qualquer da Pepsi (tenho uma foto em que só não se vêem as minhas amígdalas porque já as tinha tirado), do porta-chaves que comprei com a minha fotografia, do vidro da montra que se partiu mesmo à nossa frente, do melhor cachorro que já comi comprado numa rua com modelos humanos nas montras a um senhor que adorava Lisboa, do dia em que deixámos a escola inteira à espera no comboio porque ninguém nos avisou que a hora mudava e ganhámos uma viagem a velocidades indescritíveis pela cidade com o guia, dos tops que todas comprámos iguais, da estátua dos leões a que subi para tirar uma foto para dar ao pai (e as dores que senti nos pés quando saltei de lá), da bola de futebol que uns senhores de barco na Serpentine nos devolveram (tenho uma foto no meu quarto nesse mesmo sítio), de um colega ter ficado para trás no metro e o pânico se ter instalado, de ter enjoado o McDonalds por ser quase a única coisa comestível. Mas, do que nos lembramos todos ainda melhor, é da noite passada no aeroporto. Ninguém contava com o acidente na auto-estrada, nem que o piloto não nos deixasse entrar depois do nosso pequeno atraso. Chorei nem sei bem porquê – talvez porque sou mesmo chorona, de mão dada com o Tuto, enquanto tentava ligar para avisar os pais. A verdade é que este talvez tenha sido o melhor momento de Londres: passar a noite naqueles bancos (confortáveis, não como os de Paris, onde se dorme muito mal – por experiência própria), tirarmos fotos uns aos outros a dormir de boca aberta ou em poses mais impróprias, ver a V. comer um Big Mac às 04:00 da manhã, fugir de polícias por jogarmos à bola nas escadas rolantes, tirar fotos em todas as máquinas disponíveis pelo aeroporto enquanto tivemos libras, marcou-nos mais, aproximou-nos mais. Fazendo contas, conheci Londres há 13 anos atrás. Está mesmo na hora de voltar lá. Depois do mau tempo, da greve dos senhores espanhóis, das ameaças da TAP, parece que é mesmo hoje. O roteiro está feito, quase todo gratuito. Já está tudo enrolado na mochila e os líquidos divididos pelos frasquinhos de 100ml, nada de bagagem de porão, porque tempo é coisa que nos falta e vale libras. Eu e o Z. voltamos ao ar hoje às 19:30. - Não saltes desta vez L.-inha!, diz-me o senhor Viseu enquanto me deseja boas férias. Não, desta vez é mesmo até Londres. ‘Bora lá.

 

 

Volto na terça à noite, e na quarta de manhã sigo logo para o Andanças, em São Pedro do Sul, até sábado, com um grupinho bem bom. Como me dizia o rádio do meu popó há pouco, “o que faz falta é animar a malta”. ‘Bora lá.

 

Deixo por aqui a banda sonora dos meus pensamentos dos últimos dias, que tem tocado em modo repeat aqui no estaminé desde que a A. anda a treinar para o concerto de logo à noite (aqui não temos acesso ao YouTube, peço desde já desculpa se as imagens que acompanham o som forem muito más ou pirosas):

 

Sexta-feira, 15 de Julho de 2011

.Batalha

No outro dia, enquanto via uma das séries que me fazem reservar o sofá com antecedência, ouvi um dos personagens dizer que os erros de hoje são a solução de amanhã. Dei-lhe mais ou menos razão. Às vezes irrita-me ouvir “tudo acontece por uma razão”, “pelo menos aprendemos”, “alguma coisa podemos tirar daqui”. Mas ontem, enquanto lia a mensagem que a Ce. mandou onde explicava, com a força que vão sempre buscar não sei onde ou como, que os caroços estranhos que lhe apareceram no corpo têm o mesmo nome da doença que o Tuto teve, foi nessas frases que pensei. Espero que os erros que levaram o Tuto de nós se tornem na solução para a Ce. e para todos os que enfrentam o papão-linfoma. E depois tremi e chorei sozinha, como no dia em que ela me explicou os sintomas que reconheci tão bem, porque agora isso não interessa para nada. As lágrimas acabaram. A partir de hoje é só força, amor, amizade e sorrisos (como sempre). E contra todas estas armas não há-de haver papão-linfoma que resista. A batalha começou, mais uma vez. Mas desta vamos levar a melhor.

Quarta-feira, 11 de Maio de 2011

.Penso em ti todos os dias

Li por aí, em qualquer lado, que só morre quem é esquecido. É por isso que sei que vais viver para sempre. Penso em ti todos os dias. Hoje muito mais. [Parabéns]

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Segunda-feira, 18 de Abril de 2011

.Falámos

Na noite de sábado sonhei contigo. Estava num hospital, perto de Belém, com vista para o monumento aos combatentes do Ultramar – não me perguntes porquê. Sei-o porque era a vista da janela do corredor por onde passei muitas vezes, sempre à tua procura. Corri todos os cantos do hospital, e nada de ti. Perguntava a toda a gente, corria, entrava em todas as portas. Até te encontrar. Estavas de pé, encostado à cama, à minha espera, com uma t-shirt verde que sei não ser tua – nos sonhos baralho tudo, misturo tudo, vou buscar tudo. Era a t-shirt que o Z. levava no dia da viagem. Disseste-me: “Precisas mesmo de falar comigo, não é? Procuraste-me tanto”. Abriste-me os braços e eu encaixei-me neles, enquanto as lágrimas caíam antes mesmo de eu pestanejar – mesmo como nos últimos dias, como hoje. E falámos.

Hoje, a caminho de Lisboa, decidi parar no cemitério. Não me lembro nunca de ter entrado num sozinha. Não senti medo, só que precisava mesmo de ir ali. Estive lá uns dez minutos. Vi a placa nova, onde colocaram “Tuto” – mas alguém te tratava por Augusto?, pensei. Nem os professores o faziam. Vi as datas marcadas a dourado – quatro anos, já passaram quatro anos desde que saíste daqui. Fiquei ali, de pé, a intervalar as lágrimas com as rezas até acalmar. E falámos.

Já estava de saída quando ouvi “Menina, menina”. Confesso que me assustei, ia jurar que mais ninguém estava ali. Já devia ter mais de 70 anos, e estava de pé, em cima de uma das campas altas, a lavar o mármore, que o tempo escureceu, com um pincel e lixívia. Pensei que quisesse ajuda para descer – nem percebi como é que ela tinha conseguido subir. “Pode trazer-me este baldinho com água? É que se eu for buscar depois já não consigo subir”. Explicou-me onde era e fui lá. Quando lho entreguei, agarrou-me as mãos com força e, enquanto dizia “Deus lhe pague menina”, começou a chorar. E eu chorei com ela, já sem saber bem porquê. Uma vez mais. Depois entrei no carro e segui para o trabalho. E falámos.

Lá fora: [nada]
Sexta-feira, 6 de Agosto de 2010

.Terrinha

Todos os anos era a mesma coisa: chegava o mês de Agosto e com ele a contagem decrescente para as festas da terrinha. As festas e tudo o que elas traziam. A casa cheia de amigos divididos pelo chão do meu quarto e da mana, as pizzas de metro e meio da mãe, as saídas até mais tarde, os meninos bonitos das outras aldeias que nos faziam suspirar por uma dança, a actuação do rancho, os amigos que só lá estão por esta altura do ano, as noites na quermesse a vender rifas. Hoje começam as festas. Não vou levar ninguém comigo, a mãe não vai fazer pizza, já não suspiro por uma dança a não ser nos braços que conheço bem ou por mais umas horas fora de casa, já não danço no rancho nem gasto o meu sorriso a vender rifas. Hoje vou lá estar porque sim. Porque faz parte, porque preciso. Hoje vou estar noutra posição, no palco a apresentar. E, lá de cima, espero conseguir ver tudo o que um dia já vi ali.  

 

 

Estou: "Ninguém vai ficar parado..."
Terça-feira, 11 de Maio de 2010

.12

Este foi o número exacto de vezes que chorei desde sexta-feira. 12. Ando uma choramingas do pior que existe. Não me controlo, acontece qualquer coisa e lá vem um rio de lágrimas. Fiz-me à estrada para o Alentejo no sábado, esqueci a via verde e segui pela auto-estrada até VN, debaixo de uma chuva que não me deixava acelerar. Fui recebida por um meio sorriso da mãe. E esta foi a primeira vez.

A segunda foi quando entrei na casa de banho e não vi o espelho, antes embutido nos azulejos. No lugar dele estava um mais pequeno, redondo, de substituição, e por trás via-se só cimento. Olhei para o fundo e o nosso polibã também tinha sido substituído – no lugar dele estava agora um novo, grande, com hidromassagem, luzes e rádio. E foi quando o pai entrou por ali adentro todo entusiasmado, a ensinar-me a mexer com os botões e a ligar-me a rádio Amália para eu ouvir enquanto tomava banho, depois de um telefonema que me deixou triste, que começou. Mas isto não é bom?, dizia-me ele. E eu abracei-o com muita força, enquanto tentava encafuar as lágrimas que teimavam em sair bem no fundo de mim.

E lá fomos os cinco – a mãe, o pai, a mana e o moço dela, para o baile de finalistas do primo F.. Foi quando ele me apareceu à frente, de cabelo à betinho, fato e gravata, o sorriso que eu mais gosto e um beijinho na testa, que voltei a abrir a torneira. Dei por mim a pensar nas coisas que ouvi tanta gente dizer-me um dia: peguei-te ao colo, dei-te banho, troquei-te a fralda, e agora aqui estás tu, crescido, com uma miúda debaixo do braço, quase a caminho da faculdade.

Passei pela mesa das professoras e aí chorámos todos – eu pela quarta vez. Falámos dos amigos, da turma, das escolhas, dos momentos que não voltam atrás, de como aquele baile teve um dia tanto significado para nós. Sentei-me depois na mesa reservada à família, e começou a passar o vídeo composto de fotos de todos os finalistas, ao som do Forever Young, Fame e Não há estrelas no céu. Quinta vez. Estava a prometer a mim mesma que era a última, quando sou abraçada por trás em pleno salão de baile. E foi quando olhei para trás que esqueci as promessas. Sexta vez. Era o CS.. Fomos da mesma turma desde o 9º ano, amigos até mais não, passámos por situações más, mesmo más, juntos, boas e muito boas também. Enfrentámos juntos a entrada na faculdade, o assumir das opções que nunca deviam ser escondidas e de alguns erros. E de repente, de um dia para o outro, entra num cruzeiro para trabalhar e está anos sem nos visitar, deixando só uma foto de cada país por onde passa na nossa caixa de email. Depois veio a S., também da turma do secundário. Colega de casa da Travessa Henrique Cardoso. Amiga do peito. E começámos a falar e a partilhar segredos que desiludiriam talvez quem nos rodeia. E não uma à outra. Sétima vez.

Foi por esta altura que pensei que chegava de choro e subi ao palco para dançar ao som do Dj não sei das quantas, com a minha Su., que tão bem me fez nestes dias, e pela mão do primo F., que dançou comigo pela primeira vez. Estava tudo a correr muito bem: muita dança, muitas bifanas, caracóis às 03:00 da manhã e uma fatia de todos os bolos que estavam à venda. Mais ou menos por essa hora, decidimos passar para o Xárix, como dizia o tio Ma., o bar Asterix. Foi quando apanhei dois ex-namorados do tempo da escola, dos tempos em que um namoro se resumia a passar o intervalo juntos e a tentar tocar com a mão na mão do outro sem corar, que passaram o tempo a dizer-me “estás igual”, que começou a oitava vez. A nona só chegou já pela madrugada adentro, quando partilhei a cama com a mana – não dormíamos juntas há uma eternidade. Senti o braço dela por cima de mim, como nos velhos tempos, e veio-me tanta coisa à cabeça: as birras que apanhava porque não queria dormir sozinha, porque queria dormir comigo, como me abraçava com força, como era pequenina, como nem sequer ocupávamos metade da cama. Coisas que já passaram.

No domingo entraram por mim adentro sem pedir licença. A mim, que nunca deixei sequer que me fizessem o teste da agulha, mostraram-me um futuro que não planeei. E foi aí que chorei, pela décima vez. A décima primeira chegou à noite, quando partilhei a cama de 4m2 com a minha A.. Ela não reparou, porque o sono nos fez adormecer muito rapidamente. Mas enquanto transformávamos os dias em palavras, no escuro da noite, dei por mim com a cara molhada outra vez. A última só aconteceu ontem. Fui buscar o C. ao aeroporto, vindo de França. Os companheiros de viagem riam dele, porque me tinha comprado uma caixinha de bolinhos como os de Paris e passado o dia com ela na mão. De manhã até às sete da tarde, hora em que aterrou, andou com aquilo direitinho, certinho na mão e no colo. Foi quando saí do carro, já perto de casa, com o meu ar normal e desastrado, que atirei com a caixa ao chão e os bolos que não ficaram na estrada misturaram-se todos. Chorei, enquanto tentava limpá-los e provar pelo menos um bocadinho de todos. Um choro que se manteve até à noite, quando conversámos no sofá a ver “Sem Rasto”. O C. tem-me dito muitas vezes nos últimos tempos que só me vê feliz quando estou no Alentejo. Este fim-de-semana provei o contrário, nem lá consegui estar bem. Vejo os últimos tempos de forma diferente. Como se não houvesse espaço, como se não encaixasse, nem houvesse um sítio perfeito, como se não estivesse ninguém à minha espera num lugar qualquer, como se nem me reconhecesse a mim própria. E estou irritada. Comigo mais do com qualquer outra coisa. Porque o meu pai tem mesmo razão e sou uma choramingas que não luta por nada. Uma choramingas do pior que há. Elevada a 12.

 

Hoje é dia 11 de Maio. Dia do Tuto. Dos 26. Não consigo deixar de pensar que ele, que eu faço questão de trazer comigo todos os dias, é a pessoa que mais está desiludida com tudo o que faço. Imagino-o a subir as mangas da t-shirt, a endireitar o boné, e a dizer-me: “miúda, não foi nada disto que combinámos”, mesmo antes de me abraçar com um sorriso. Penso em ti todos os dias. Parabéns.

 

Lá fora: "não fazes parte da minha vida"
Segunda-feira, 12 de Abril de 2010

.Os números de 4 dias de estudo

- 2 banhos de espuma – um deles com direito a sesta e iPod nos ouvidos. Fazemos figuras muito estranhas quando estamos sozinhos em casa.

 

- 1 queda – contrariando todas as expectativas e previsões baseadas em estatísticas, ainda só havia registo de uma queda minha cá em casa. Tinha sido na casa-de-banho, daquelas à filme: escorreguei e fiquei com a cabeça no tapete. Desta vez inaugurei outra divisão, a sala. Estava a tentar levantar-me do sofá e pisei o tabuleiro com pizza que estava aos meus pés. As minhas quedas são sempre em câmara lenta, saio à minha avó T., por isso tenho tempo para tudo: consegui evitar a quina do móvel e só a nódoa negra do joelho prova que caí. Ou talvez esta nódoa ainda seja da semana passada, quando caí nas escadas do Alentejo e distribuí as pernas, os braços e a cabeça por vários degraus.

 

- 2 pacotes de esparguete – em várias versões, carbonara (de momento,o favorito cá de casa), com atum, com tomate, com parmesão.

 

- 1 tinteiro de tinta preta – permitiu imprimir todo o material de estudo, que enche, mais ou menos, dois dossiers dos grandes.

 

- 1 saída de casa -  para ir comprar pão e apanhar ar. Já estava na caixa para pagar, com um pacote de bolachas de chocolate na mão, quando olhei para o lado e vi uma senhora tão forte, tão forte, que me fez sentir mal e voltar para trás: bolachas na prateleira, nos braços duas embalagens de essencial de manga e de pêssego e uma papaia.

 

- 1 quase atropelamento – quem me conhece, sabe a minha obsessão com o lixo, reciclagem e coisas parecidas. O Tuto atirava coisas para o chão só para me ver correr atrás delas, a minha mãe foi obrigada a parar o carro porque a vi atirar uma casca de banana pelo vidro. Lá ia eu, a caminho do Intermarché, com um pacotinho já vazio de bolachas de chocolate na mão (o último que restava!), quando ele voa das minhas mãos para a estrada. Corri atrás dele, sem olhar para os dois lados. Levei uma apitadela – daquelas acompanhadas de “és cega ou quê?”, e apanhei um grande susto, mas salvei um pacotinho de plástico do abandono. Depois, deixei-o no ecoponto. Todos merecemos outra oportunidade.

 

- 1 par de Fly – usei calçado de Verão! E roupa de Verão!

 

- 1,5l água/dia – ando uma esponja, nunca pensei conseguir tal feito.

 

- 22 metros – a minha melhor marca na nova mascote cá de casa, uma bicicleta que não nos leva a lado nenhum. Provavelmente andei mais uns metros, mas como estava a tentar andar e estudar ao mesmo tempo, com os apontamentos na mão, ela não registou os meus batimentos cardíacos e começou a piscar por todos os lados sem que eu me tivesse apercebido.

 

- 42 – músicas que acrescentei ao meu iPod e que não posso mostrar a ninguém, correndo o risco de levar à destruição da credibilidade que consegui em 25 anos.

 

- +/- 100 – número de vezes que o C. disse ‘vamos ao México’ ou ‘vamos a França’.

 

- número indefinido – vezes que fui apanhada sem estar a estudar.

 

- 10 – número de porquinhos que a Felícia deitou ao mundo – o Felício foi pai! Faleceu um, restam 9. [foto enviada pela mana, porque eu estive em casa – a estudar]

Estou:
Lá fora: "Tudo o que eu queria afinal era outra vida com sal"
Segunda-feira, 18 de Maio de 2009

.25

 *

 

 

Agora que o grande dia está quase ai, ando numa de arrumações. E nada me escapa. Gavetas, secretárias, prateleiras, paredes. Tudo o que está a mais vai directamente para uma caixa – porque sou incapaz de atirar qualquer coisa para o lixo, e depois, inevitavelmente, para a parte cima do roupeiro, onde se amontoam caixas e caixas cheias de pedacinhos da minha vida. Sempre que abro a porta desta armário – o que só acontece de tempos a tempos, sou invadida por uma onda nostálgica, que me obriga a abrir tudo o que me aparece à frente. Nestas alturas, o chão do meu quarto da terrinha assemelha-se bastante a uma feira da ladra, ou a um balcão de um antiquário com peças que só para o seu dono têm valor.
 
Foi numa destas minhas fúrias, no domingo da semana passada, que encontrei este postal teu. Tinha passado o fim-de-semana a pensar em ti. Não que não pense noutros dias, mas porque na segunda-feira, dia 11, farias 25 anos. 25. Um número pequenino, jeitosinho, como dizíamos – como todos os da tabuada do 5. 25. Quem não faz 25 anos? Tão fácil chegar lá. E, no entanto, não estás aqui.
 
O postal data de 2002, o ano dos 18, que nos marcou tanto. Partilhámos o desejo de chegar aos 12 (chegámos a esta conclusão mais tarde) só para podermos entrar na Makro, o de chegar aos 16, para entrarmos no Astérix sem problemas, o de chegar aos 18 para tirar a carta e entrar na faculdade. O selo dos correios marca 31-07-2002. Talvez ainda não soubéssemos que tínhamos entrado para a faculdade nesse ano, para aquilo que queríamos. Eu seria uma grande jornalista, tu um grande senhor da logística. Mas não era sobre isso que queríamos falar, era antes sobre tudo. Havia limites para nós?
 
Provavelmente, teríamos feito um jantar surpresa. Eu teria ligado logo pela manhã, apenas para dizer qualquer coisa e fingir não lembrar que era um dia importante. Depois ligava mais tarde, para gritar PARABÉNS e dizer-te que era complicado estar contigo nesse dia, talvez no fim-de-semana. Mas, depois, à noite, lá estaria para o teu abracinho.
 
Provavelmente, oferecia-te bilhetes para Green Day, se não os tivesses comprado já para nós. E quando estivéssemos juntos com eles na mão, gritaríamos bem alto “Do You Have The Time To Listen To Me Whine…”.
 
Tenho saudades tuas. Mas, provavelmente, já sabes disso. Este ano não pude passar pelo sítio onde me dizem que estás agora. Não faz mal. Passaste tu pelos meus pensamentos. Como fazemos todos os dias. Queria dizer-te isto: que vou casar, que tenho um vestido lindo, que tenho uma casa, que os Green Day vêm cá, que tenho dias bons e dias maus, que há pessoas de quem gosto muito e outras de quem não gosto nada, que tenho sonhos e pesadelos, que desde que partiste não consigo ouvir Red Hot, e que tenho saudades de partilhar tudo isto contigo. Queria dizer-te que tenho saudades da tua voz, do teu cheiro, de te ver subir as mangas das camisolas e de partilhar as tuas coisas.
 
Provavelmente, teria ligado para ti depois de encontrar o postal, e teríamos rido pela nossa linguagem dos 18. E terias perguntado se as luas que me deste continuam nas paredes, e se as tuas fotos continuam nas molduras, depois do meu ímpeto arrumador. E eu teria dito que sim, que há coisas que nunca podem sair daquele quarto sob pena de deixar de ser o quarto da L.. Assim como tu. Sem ti na minha vida, nunca seria a L. que sou hoje.
 
Parabéns Tuto.
 
 
 
*Oi morzão!!!! :) ‘Tás a ver, nunca me esqueço de ti, estás sempre em mim :) Olha, vou comprar cá a tua prenda de anos, se não gostares :( (os smiles são influências). Tenho bué saudades tuas, principalmente de falarmos. Temos muitas coisas a falar :( Se calhar ainda te escrevo uma carta, o postal é muito pequeno e pouco pessoal para escrever. Depois falamos melhor. Vamos às piscinas ou algo parecido. Beijos muito especiais para a pessoa mais especial para mim. My best friend :)
Tuto

 

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