Sexta-feira, 15 de Março de 2013

.Dos Outros

Frases de outros onde me encontro:

 

“A verdade é que nunca disciplina foi tão importante para mim e nunca ela me ajudou tanto. Quando parece que há coisas demais a fazer, ainda assim elas são feitas, e de repente não era nada tão grave, e me vejo contente por ter dado cabo de mais uma pilha de afazeres e sei que nesse tempo que restou posso relaxar de verdade, sem me preocupar, (…). Aprendi a duras penas que procrastinação é a pior coisa do mundo. E ainda que às vezes eu seja acusada de não saber gerir meu tempo, pois não consigo largar tudo e ir dormir quando os outros acham que eu deveria, acho que é justamente o contrário: eu priorizo sempre o que PRECISA ser feito em detrimento do que eu QUERO fazer. Uma vez feito tudo aquilo que precisa ser feito, todo o tempo restante é dedicado ao que eu quero. E uma vez que as tarefas que precisam ser feitas são incorporadas na sua rotina, uma vez que você tenha disciplina para sempre priorizá-las, elas deixam de ser um fardo, pois você elimina a escolha, o dilema entre fazê-las agora ou depois. A resposta é sempre: faça agora, tire da frente, não deixe para depois. (…) Mato tudo o que é tarefa de rotina o mais cedo possível no meu dia, (…). Lutar contra as coisas que você precisa fazer, aprendi, é a maior fonte de stress de todas, e totalmente evitável. Para que tudo funcione bem, (…), planejamento é sempre essencial.”

Ana Elisa G. Granziera

Blog http://www.lacucinetta.com.br/

 

 

"Devia haver

um curso, workshop, tutorial, vídeo no youtube, instruções, alguma coisa - qualquer coisa - que nos ensinasse a gerir expectativas."

outros dias

Blog http://outrosdias.blogs.sapo.pt/

 

L. às 14:20
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Quarta-feira, 12 de Setembro de 2012

.Solidariedade ["Por um emprego e um futuro digno"]

Sei que, na minha vida profissional, com altos e baixos, com experiências melhores e outras piores, as coisas, mais do que resultado de uma luta minha, têm-me acontecido, têm-me aparecido. Saía de um sítio para, logo depois, começar noutro, sem estar muito tempo parada. E, ainda assim, tentei sempre fazer mais que uma coisa ao mesmo tempo. Estou aqui, neste sítio que ainda chamo novo, já há quase cinco anos, e cada vez mais penso que não será por muito mais tempo. Não que alguém o tenha dito, mas será um passo natural. Não sendo funcionária pública, o patrão é o mesmo, e será muito mais fácil cortar por aqui. Sei que não terei problemas em procurar trabalho em qualquer sítio - no primeiro Verão em que estive no banco preparava-me para me dedicar à apanha do tomate, mas sinto-me triste. É um aperto que começa como um pontinho no peito, e depois quase sufoca. Como se a vontade, os sonhos, os desejos que me levaram a fazer todo este percurso não sirvam para nada afinal. Como se o esforço, o estudo, as notas, a dedicação, ..., fossem completamente desprovidos de sentido. Como se nunca acertássemos no caminho, ou não existisse um caminho para nós sequer. É o sofrimento por antecipação, a tristeza pela falta de horizontes. E a solidariedade por quem ainda está, ou já está, numa fase bem pior. Boa sorte, José. Para ti, para todos, para mim também.

 

Notícia publicada hoje no Jornal Público

L. às 11:10
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Quinta-feira, 20 de Outubro de 2011

.Revista de Imprensa

http://www.tvi24.iol.pt/internacional/idosos-amor-maos-dadas-eua-morte-tvi24/1291031-4073.html

Lá fora: "Voltaste a mentir-me..."
Quinta-feira, 7 de Julho de 2011

.Revista de Imprensa

Não sou de políticas, mas de pessoas. Hoje, ao ler a entrevista* que deu em 2006 (Canal de Negócios) e a carta de despedida no Diário de Notícias**, conheci mais uma de quem gostei, a Maria José Nogueira Pinto. Ainda que tenha sido com sofrimento, deve ser bom chegar ao final assim: sentimento de dever cumprido, vida cheia, fé inabalável, sem medos e a certeza de um grande amor.

  

*

Maria José Nogueira Pinto: "Fui sempre uma pessoa com muitas saudades do futuro"

 

Maria José Nogueira Pinto, tinha horror ao tédio e não se importava nada de ter poder. Releia a entrevista conduzida por Anabela Mota Ribeiro, publicada no passado dia 29 de Setembro de 2006.

 

(…)

Começo por um fio que trazia consigo quando esteve num campo de refugiados na África do Sul. Onde estavam escritas três coisas...

Fé, Esperança e Caridade? A minha vida tem mais coisas além desse momento...

 

Esse momento é especial, e sobretudo improvável, se pensarmos no curso que a sua vida seguiu. O que estava contido nesse fio são pilares a partir dos quais a sua vida se ergue.

Eu gostava que fosse... S. Paulo disse que quem não tiver caridade, nada terá. Entendendo a caridade como virtude teologal. É um espírito de serviço, de despojamento. É a ideia da vida como uma passagem, de que nada é nosso...

 

Ao longo da sua vida passou por momentos derradeiros, no sentido de ter de fazer escolhas grandes. Nesses, é mais fácil perceber quais são os nossos tesouros?

É. A vida está cheia de quinquilharia. As nossas vidas hoje são uma loja dos 300. Não há muito tempo fui viver para Madrid um ano e meio. Aluguei um apartamento mobilado _ não ia com tarecos..._, e vivi outra vez com quase nada. Foi um grande sossego. Enfrentar a vida como ela é, é a coisa mais bonita que há. Com altos e baixos, cair, levantar. Quando a gente passa por momentos muito grandes, cai tudo. Ficam os afectos.

 

Li uma entrevista antiga na qual falava da paixão retumbante pelo seu marido. Esse encontro mudou a sua vida.

Mudou. Era muito nova, tinha um namorico há algum tempo, mas tive a lucidez de perceber que era uma pessoa que, não só ia mudar a minha vida, como ia levar-me com ele. Eu não fiquei na minha vida, fui-me embora com ele.

 

Deve ter sido inquietante abandonar uma vida. Abandonar um conforto material, um quadro de previsibilidade, um destino que estava traçado. Pressentiu que tudo podia esboroar-se?

Saí voluntariamente. Mas nesse período de diáspora, já foram as circunstâncias exógenas a mim, não foi um acto de vontade. Ainda tive um terceiro momento, quando estive doente... Isso fez-me confirmar o bom que é estarmos na vida sem projectos detalhados para nós próprios. Fui sempre uma pessoa com muitas saudades do futuro. A vida é sempre melhor do que imaginamos.

 

Quando é.

E quando bate, não bate mal. Porque, lá está, estávamos na loja dos 300 e era preciso sacudir, atirar fora. Só quando levamos um encontrão é que isso acontece. Por exemplo: ter estado doente, ter sido refugiada, ter sido emigrante... Foram grandes oportunidades. Trabalhando muito nessas matérias, se conseguir trabalhar um bocadinho melhor, é porque sei o que isso é. Sei o que é chegar a um campo de refugiados, sei o que é não ter eira nem beira, sei o que é ser um objecto da História, sei o que é estar à procura de emprego e não falar bem a língua e ter medo de enganar... Estou muito grata a Deus por ter dado essas cambalhotas todas. Cá estamos, não é? A alternativa a isso era... muito maçadora.

 

Ora aí está a razão pela qual muda de vida.

Gostei muito da minha infância e da minha adolescência, com os meus pais e as minhas irmãs. Mas essa dimensão, essa mundivisão, foi o Jaime que ma deu. Imagine que não me tinha ido buscar e levar? Maçadoríssima, a minha vida...

 

(…)

É a história de uma aristocrata italiana, de olhos claros, que se trai a si mesma, as suas convicções, uma causa e um país, porque não consegue evitar a sensação de ser arrebatada. Mais do que a paixão pelo oficial austríaco, penso que não consegue recusar a ideia de...

Saber o que está para lá! Se não for, não vê. Embora eu não tenha tido esse conflito. A minha mãe é uma mulher muito inteligente e prática. Fui criada por várias mulheres extraordinárias. Uma tarde fomos, com a minha tia e madrinha, para o quarto conversar. A minha mãe fez um teste: como é que sabe que este é o homem da sua vida? Disse assim: «É o homem da minha vida porque se o encontrasse daqui a uns anos ia-me embora com ele. O que era uma grande chatice... Naturalmente, já estava casada e ele já estava casado... Assim, vamos agora, que não fazemos mal a ninguém». Não foi nada contrariado. Quer dizer, acharam um bocado “sui generis”...

 

Porque é que adoptou o nome do seu marido? Entre as irmãs, foi a única que passou a usar o nome do marido.

É diferente. A Maria João, antes de casar, já estava no Diário Popular, já assinava coisas com o nome dela. Eu não assinava nada. Tinha 19 anos, era estudante. Era “a Zé”. Depois, a minha mãe também se chama Maria José... Encontrei ali a minha identidade: esta que tenho até agora. O meu pai ficou zangadito com aquilo... Usar esse nome também significa que me passei para aquele lado.

 

Diz isso com orgulho?

Digo com gosto. Não é uma questão de orgulho. A vida que tenho hoje é muito marcada por ter sido com o Jaime...

 

Politicamente, é o que quer dizer?

Em todos os aspectos. Desde as geografias onde vivemos, às coisas que nos interessam, que fizemos, os filhos que temos.

 

Comecei por aquilo que parecem balizas da sua vida: Fé, Esperança e Caridade...

Tudo isto são actos de fé, e de esperança.

 

As áreas de que se ocupa na sua vida profissional coincidem com estes pilares. E parece que elas teriam sido as mesmas, ainda que não tivesse encontrado o seu marido.

Não, não. Houve imensos constrangimentos que se transformaram em grandes oportunidades. Eu seria advogada, e não fui. Porquê? Porque interrompo o curso por causa da ida para África. Porque quando venho tenho de começar a trabalhar. Fui essas coisas todas, que começam por resultar de uma falta de estatuto.

 

Falta de estatuto?

Sim. Chego aqui, sem emprego, o meu marido sem emprego, numa situação em que precisávamos de deitar a mão a tudo.

 

Seria impensável, por uma questão de orgulho, pedir(em) ajuda à sua família?

Sim. Isso é péssimo. A não ser numa situação de doença. De resto, cada um tem de andar por si. O que me apareceu na altura foi fazer fichas para o Dr. António Barreto.

 

Quando teve de procurar trabalhos mais humildes...

Nunca me fez confusão nenhuma. Nunca. Explica-se pouco às pessoas que a vida não é o que queremos: é o que é. E que nos resta uma coisa fundamental: sermos capazes de gostar disso.

 

Conte a história das fichas.

Ainda não estava formada. Eles eram todos investigadores, o Pacheco Pereira, a Filomena Mónica, o Vasco Pulido Valente, o Medeiros Ferreira, o Manuel Lucena. Eu era a rapariguinha que fazia as fichas... Conto sempre esta história porque é elucidativa de quem é o António Barreto. Um dia eles estavam a discutir e não resisti e meti a minha colherada. Aquilo prendeu-lhe a atenção, conversámos mais e ele disse: «Escreva o livro». Mas eu não sou formada, não posso ser investigadora... «Não interessa, escreva o livro».

 

É daí que resulta o «Direito da Terra».

As fichas, que era um trabalho pago à hora e de copiar os Diários da República, passado um ano e tal era um livro. Se não fosse fazer as fichas, não tinha feito o livro. Logo, as fichas foram muito importantes.

Isto passou-me em 1978/79. Tinha os meus dois filhos e nem 30 anos. O que lhe estou a dizer é que um caminho normal não comporta isto. Troquei um caminho normal por uma coisa incerta, que teve os seus momentos complicados, mas que permitiu sair do programa.

 

Dito de um modo abreviado, o que se comentava é que era uma menina bem que se tinha tresmalhado, porque se tinha apaixonado...

Não tenho essa ideia. Sempre tive muitos amigos de esquerda. Eram talvez os mais próximos. Em termos de opções políticas, aquele foi um momento de ruptura, e as pessoas estão contra ou a favor... Pôs-nos de lados diferentes. E isso magoou alguns. Mas quem tinha a ideia da menina bem eram as pessoas que me conheciam muito mal. Estudei no Liceu Rainha D. Leonor, andei na escola primária do Campo Grande. Nós tínhamos uma preceptora de francês, uma professora de piano, mas ia tudo para a rua. Brinquei com toda a gente.

 

A sua formação, se não fosse muito sólida, não lhe permitiria, mais à frente, ser “raptada”, e gostar disso; bem como fazer face a tudo aquilo a que teve de fazer face. É preciso auto-estima.

Isso sim. Tivemos uma educação que não era do nosso tempo. Com muita liberdade. Também com muita fantasia. O dinheiro não contava nada; era considerado feio falar de dinheiro. Havia espaço, que era um grande luxo. Havia 12 pessoas a trabalhar em minha casa, pessoas que ficaram muitos anos. Eram um afecto seguro. A auto-estima vem toda daí: de nos sentirmos amados e de um espaço com muita liberdade. Ali detestava-se o preconceito, o “parece mal”, a “ideia das aparências”.

 

Entre as três irmãs, é a mais católica?

É difícil dizer o que é ser mais católico. Mas Deus dá-nos essa liberdade: a de nos irmos embora e voltar. O filho pródigo... «Deixarás as 99 ovelhas para ires buscar a ovelha tresmalhada». Deus ama mais a ovelha tresmalhada.

 

Foi por isso que foi embora! Como que um teste: os seus pais ama-la-iam, mesmo tresmalhada.

Os meus pais posicionaram-se sempre como pais que amavam os filhos que se podiam tresmalhar. Nunca ouvi dizer: «Só cá ficas se, ou só gosto disso se...». Não tresmalhei nada. Os meus pais acharam muito bem. Tenho a certeza que a minha mãe partiria com o meu pai e nos deixaria bem entregues. E fazia muito bem.

 

Fiquei surpreendida ao saber que deixou o seu filho cá, quando partiu para África com o seu marido.

Deixei. Onde eu fazia falta era ali, e não aqui. Fazemos falta nos dois lados, mas isso é que são as rupturas: temos que escolher entre males menores. Tudo o que determinou a nossa vida seguinte foi muito a partir daquele momento. Eu tinha de estar ao lado dele. Éramos combatentes do mesmo combate, soldados do mesmo exército. O meu filho não precisava de mim: precisava de ser alimentado, acarinhado, e estava com duas avós, uma tia-avó, duas tias... Estava muito bem. Sofri imenso, imenso. Mas não tinha dúvidas que era lá que tinha que estar, e foi lá que estive.

 

Aí, era ainda a romântica que quer estar no coração da História?

Não, não. Aquela história era a minha. Nós casámos com comunhão de adquiridos, e aquilo era a minha história, tanto quanto a dele. Ele nunca me pediria para eu ir. Mas tomei essa decisão, e penso que achou importante que eu fosse.

 

Quanto tempo esteve sem ver o menino?

Seis meses. Ele tinha um ano. Eu não voltei [a Portugal, para o apanhar]. Quando o vi no aeroporto de Madrid ele tinha mais seis meses.

 

Foi daqui para Angola, daí para a Namíbia... E não podiam entrar em Portugal.

E depois, África do Sul, Pretória. De Pretória vim buscá-lo a Madrid, para onde a minha mãe o passou como se fosse meu sobrinho, com o passaporte dela. Foi terrível. Mas não podemos ser moles, entrarem auto-compaixão. Todosos dias no mundo acontecem coisas terríveis, não é?

 

Com certeza. Mas há umas que resultam da nossa escolha, e outras nem tanto...

Mas a toda a hora temos de escolher, e não temos a verdade absoluta. Escolhemos o melhor que podemos. Reunificação familiar, também sei o que é.

 

Surpreende-me que fale de tudo isto...

Porque não? Não gosto de falar tantas vezes, mas todos querem saber esta história! Há coisas mais interessantes a dizer.

 

Então, diga.

Falo destas coisas, como falei da paralisia facial. Reduzimo-las à sua verdadeira dimensão. Isto é a minha pequena história, não estou a dizer que seja importante. Quando nasci ou quando tinha 14 anos, não imaginava que me pudesse acontecer. Mas aconteceu e tomei-a como...

 

Um livro que se lê sofregamente?

Exactamente. Li tudo o que se lia. Do Hemingway ao Alves Redol, ao Huxley.

 

Uma heroína como a Bovary deve ter feito as suas delícias. O que há em comum entre as duas é um desejo imenso de contrariar o tédio.

Tocou num ponto... Vivi uma circunstância que se deveu ao facto de estar viva num país que teve uma ruptura histórica. Recebo refugiados, recebo imigrantes. Ao longo da minha vida, só tive uma oportunidade de estar do lado de lá. Não diga que isto não é óptimo! A minha vida é uma coisa wagneriana porque a faço wagneriana. Porque sou assim. Tenho horror ao tédio, ao “já sei o que vou fazer para o ano”. Por isso é que na política não hei-de ter grande futuro... Não tenho projectos.

 

Porquê?

A vida ensinou-me que não vale muito a pena. E pensar que vou amanhã fazer uma coisa para ter mais três votos, é um desespero. São cavalgadas. A Baixa-Chiado [projecto de que se ocupa enquanto vereadora da Câmara de Lisboa], é uma cavalgada_ agora é esta.

 

Interessa-me perceber que tipo de ascendente tem o seu marido sobre si. Conheceu-o quando ele foi a sua casa convencê-la a assinar um abaixo-assinado.

O Jaime é mais velho seis anos. Andava no quinto ano de Direito e eu no primeiro. Trabalhava na televisão. Ele falava de imensas coisas em relação às quais presumia o meu conhecimento, que eu não tinha. Dos factos e dos raciocínios que se podiam fazer sobre os factos. A primeira coisa em que pensei é que não era nada maçador. Não tínhamos nada para nos encontramos... Como um cruzamento de duas carruagens de metro.

 

Estamos também a falar de relações de poder. Que é do que se fala quando se fala de ter ascendente sobre o outro.

Jamais casaria por casar. A minha mãe sempre disse que a monogamia é contra-natura, por isso «vejam lá com quem casam»...

 

Isso vindo da mãe, tem graça.

Fomos habituadas a ouvir estas coisas, a vida é assim mesmo. Nunca tive a ideia de casar com qualquer um ou porque tinha chegado a idade de casar. Eu só me casaria com alguém que tivesse um forte ascendente sobre mim. Que é o caso. Não me envergonho de dizer. Crescemos juntos. É uma pessoa a quem peço sempre conselho, com quem penso em voz alta, com quem discuto as coisas. Acho que agora é mútuo, mas não quantificamos o ascendente!

 

A sua vida é feita de ciclos. Se olharmos para esse ciclo, tão recuado, parece que não tem que ver com o actual.

Mas depois vai ter... Os interfaces, não os controlamos. Mas a vida tem mostrado que os interfaces se têm feito correctamente. Tem batido tudo certo, o bom e o mau. Não fazia de outra maneira. Naturalmente só sabia fazer assim... Decidi sair da Misericórdia e candidatar-me em 24 horas. Foi o tempo de perguntar ao Jaime e aos meus filhos. Eram as únicas opiniões que queria ter.

 

Aí, mais uma vez, impera o desejo de ser arrebatada por uma ideia.

Exactamente!

 

Para que é que lhe serve o poder?

Para fazer. Posso não saber como se faz, mas percebo como se pode fazer. Tenho a “teoria geral” e chamo as equipas. O resultado do meu trabalho é sobretudo um resultado de equipas. A palavra entusiasmo vem do grego “sopro divino”: é o momento da revelação. É um sopro em que a gente percebe que podia mudar. E depois faz-se. E depois de estar feito já não tem interesse nenhum. Tem que se passar para outra coisa.

 

O seu discurso é profundamente católico. Se não fosse católica sentir-se-ia mais desamparada?

Ai, sentiria. Isto encaixa num sentido. É preciso haver uma disponibilidade. Tem de se estar à escuta. E vem das formas mais diversas. Um livro que estamos a ler, uma pessoa que encontramos por acaso, alguém que fala comigo na rua...

 

Vou dizer-lhe uma coisa, que, espero, não seja ofensiva: parece mais nova pessoalmente que na televisão. Não é só por não estar maquilhada; é porque tem um brilho e uma disponibilidade quando fala disto que nunca percebi na televisão.

Tenho o meu parceiro à frente, o Mário Crespo [risos], e não quero que ele vá para lá divagar, como você! Gosto muito da condição humana. Como todo o pecado tem perdão, [Deus] não nos mergulhou no opróbrio. Que hoje a sociedade nos coloca, se não fazemos como as pessoas querem, se as setas vêm para baixo, se parece mal... No outro dia um jornalista perguntou-me se repito os vestidos, e eu disse que sim. «Não acha que pode parecer mal?», «Não, só se fixa uma mulher excepcional ou um vestido excepcional». Numa festa fixa uma mulheraça ou um vestidão!

 

Pois olhe que eu bem “fixo” os seus lenços Hermès!

Por acaso está aqui um... Os lenços são todos presentes do Jaime. Por isso é que são bons. Eu só compro porcaria para mim.

 

Vai à Zara?

O mais possível! E compro às ciganas, sou grande amiga das ciganas! [risos]

 

Considera-se extra-ordinária? Porque foi esse destino que procurou: aquele que a levasse do ordinário.

Isso sim. Dou tudo o que posso a uma empreitada. E depois esgotei-me. Normalmente ela fica feita e eu cumpri o meu ciclo. Como se fosse uma transfusão. Tenho de passar para o lado de lá. Senão fico da cor das paredes. As pessoas não perceberam porque é que saí da Misericórdia.

 

Porque foi?

O segundo mandato era já uma grande revolução, e não era líquido que tivesse condições para a fazer. Fazer um banco da economia social, ser um motor entre as instituições financeiras para a economia social, já estávamos a caminho de presidir à associação europeia das lotarias, e da mundial... Era uma escalada muito incómoda e o país não nos permite escaladas muito grandes. Para ficar a fazer gestão corrente... Não é que me ache muito importante, mas não tenho essa energia. O melhor é ir para casa.

 

O que é que lega aos filhos? Que imagem têm os seus filhos de si?

O que se deixa é o exemplo. A minha educação já foi muito assim. Não interessa nada o que dizemos aos filhosem teoria. Interessao que os filhos vêem todos os dias. Mesmo quando nos vêem vulneráveis. Odeio essa coisa das super-mulheres.

 

Alguma vez os seus filhos a viram discutir com o seu marido, por exemplo? Uma discussão conjugal, quero dizer.

É possível. Mas eles sempre tiveram a noção de que gostamos muito um do outro. Vêem quando estou aflita, preocupada, triste. Chorar, não tem mal nenhum, não é?

 

Viu os seus pais chorar?

Vi o meu pai chorar duas vezes em momentos trágicos, e a minha mãe a chorar uma única vez. Naquela geração ainda se tinha a ideia de que chorar à frente dos filhos era afligi-los. E não é. Muitas vezes são os filhos que nos amparam.

 

Como é que os “assuntos de mulheres”, íntimos, eram abordados na sua família?

Tirando o dinheiro, tudo era abordado. No nosso meio social havia famílias com muito mais dinheiro, e outras com menos. Habituámo-nos a respeitar as que tinham menos e a não invejar as que tinham mais. E foi muito bom, porque quando fiquei sem absolutamente nada, naquele período em que estive lá fora, habituei-me a viver sem nada. É uma aprendizagem muito útil. Não me senti atrapalhada, sequer.

 

Por ter de lavar roupa...

Sim, e não poder comprar, e andar com a roupa que as pessoas me davam. Nada disso me tornou desgraçada ou me fez sentir vergonha. Mandaram-me uma mala daqui, com roupa. Eram duas irmãs, muito amigas da minha tia, que se vestiam nos grandes costureiros. Foi caricato: no período mais pobre da minha vida desembarcou uma mala com um número infindável de etiquetas! [risos] Nunca andei tão bem vestida! Fiquei-lhes sempre muito grata. Elas podiam não ter tempo de ir procurar roupas, metê-las numa mala, despachá-las... Essa atenção, essa disponibilidade, esse tempo...

 

Nessa altura, já tinha ido à Cartier vender as suas joias?

Já, mas não era para comprar roupa, era para comer.

 

Com certeza. Mas faz diferença entrar na Cartier para vender joias e estar bem vestida.

A única coisa que me fez aflição foi pensarem que eu tinha roubado. Não tinha os certificados, nada.

 

Lembra-se como estava vestida?

Estava de jeans. Saímos com pouca coisa. Tinha levado um vestido para arranjar emprego, uns jeans, umas camisas. Mas ali, o ser loura e ter olho azul teve alguma influência. Eles também tinham ouvido falar de Portugal e da Revolução, estava muita gente a sair de Angola e de Moçambique. Temos que perceber: as pessoas vulneráveis, os medos que têm, vêm destas coisas. Medo de serem apanhados, mal interpretados, de acharem que estão a roubar. Tenho, desde essa altura, atenção a isso. Depois, sim, na fronteira, há o medo de ser apanhado... E mesma aquela coisa de as senhoras que me puxaram o fio [no campo de refugiados]: não é que me tivessem humilhado...

 

Eram enfermeiras da Cruz Vermelha?

Eram senhoras voluntárias, pertenciam às classes altas de Joanesburgo. A minha tia também era da Cruz Vermelha. Percebi como podemos não ter atenção. Era uma fila de mulheres e crianças _ os homens comiam à parte, não sei porquê_, e era mais uma; mas trazia um penduricalho. Não me humilhou. Só pensei assim: será que alguma vez fiz uma coisa destas? Jurei a mim própria que nunca faria isso a ninguém.

 

Conte como foi a cena.

Fui buscar a minha sopa. Elas estava a servir a sopa, viram o fio e puxaram-no. Puxaram-no como se eu fosse um bezerro. As pessoas não fazem por mal...

 

Ou fazem.

Não, coitadas. Estão desatentas. Era um fiozinho de prata, uma coisa de miúda, não valia muito. As joias estavam escondidas. Não mo partiram, só acharam curioso e puxaram, como podemos puxar por uma coisa que está num cabide. É só esta ideia...

 

De que valemos muito pouco?

Ora bem! Por isso, não vale a pena estar com peneirices. Nasce tudo e morre tudo da mesma maneira. Tudo isto foi muito interessante.

 

(…)

A sua avó fazia uma sopa dos pobres láem casa. Porisso é que há pouco lhe dizia que as áreas em que foi trabalhando são anteriores ao Jaime.

A minha avó marcou-nos imenso. Estava sempre a dizer mal dos ricos e das coisas boas. Estava sempre a lembrar que havia quem não tinha. Era uma chumbada de uma conversa! Mas era por causa do exemplo. A minha avó andava de autocarro e quando já não era assim tão nova, a minha mãe ralhou-lhe: «Credo, mãe, vai assim». E ela respondeu: «Mas onde quer que eu encontre o próximo se não nos autocarros ou comboios ou eléctricos?».

 

Isso inculcou, presumo, um complexo por ter sido privilegiada.

Não criou sentimento de culpa, mas acendeu uma luz amarela. Era um semáforo, sempre a chamar atenção. Era gente muito inteligente. Mesmo coisas que hoje estão muito na moda, por exemplo, a homossexualidade: não tinham importância nenhuma. A minha avó tinha grandes amigos em meios artísticos. E lembro-me de ela comentar, com graça e sem acinte, as pessoas e os seus hábitos, aquilo a que agora se chama as orientações sexuais. Não tinham que ser todos iguais a nós. Não defendo nada que as pessoas sejam todas iguais.

 

(…)

Como é que viveu o seu acidente? Mudou a sua vida?

Mudou. Já tive muitas vidas, como os gatos. Foi a seguir ao nascimento da Catarina, tinha 24 anos. Mudou a minha identidade. Foi uma doença complicada, que não correu bem. Depois foi a paralisia facial. Depois decidi que não falava maisem público. Estavaa acabar de me formar, dispensei a todas as orais, para não falar. Fui fazer o estágio. Um dia, ali no Palácio da Justiça, percebi que o processo estava mal instruído e que o homem estava inocente. «Se eu não falo, ele vai condenado». E falei. Tinham passado dois anos. Depois pensei: que estupidez, para que é que vou ficar calada?

 

É engraçado: salvou-lhe a vida, mas é como se ele tivesse também salvo a sua.

Pois foi. Mas foi uma aprendizagem: a ser a mesma pessoa, contudo sendo outra. A cara é a nossa marca distintiva... Por alguma razão Deus mandou isto.

 

Que resposta encontra?

Talvez me tenha tornado melhor. Às vezes penso nisso. Por exemplo, o estar internada em hospitais estrangeiros. O estar sozinha _ muitas vezes tinha que estar. O não ter dinheiro. O estar em Londres numa enfermaria com pessoas a morrer. Foi quando comecei a pensar como é que se punha em ordem a saúde. Foi o que me fez pegar em coisas da saúde. Tudo isto foram viagens ao outro lado da vida.

 

É um processo simétrico: nesta segunda fase da sua vida está directamente ligada a experiências pelas quais passou, mas ocupando um outro papel.

É isso. Estou do lado de cá e nunca me esqueço do que é estar do lado de lá. Posso ser mais útil assim. Em relação à política, permite perceber como é vácua. O poder é instrumental. Deveria ser, pelo menos. Não me importo nada de ter poder. Terem-me dado a oportunidade da Baixa-Chiado? Vale a pena ter poder para fazer isto.

 

Já não se usam os epitáfios. Mas para quem tem um cristianismo tão arreigado, imagino que a vida seja um balanço permanente. Um epitáfio resume uma vida, é uma linha a partir da qual podemos evocar aquela pessoa.

Nunca pensei. [risos] Há um poema do Álvaro de Campos, muito bonito: «Quando eu morrer podem dançar e cantar à roda do meu caixão. Não tenho exigências para quando não puder ter exigências». Agora tudo quer ser incinerado. Eu não. Quero ir para a terra. Ando a ver se arranjo companhia! O Jaime já disse que vinha comigo.

 

Não acha extraordinários os casais em que um morre e o outro não sobrevive senão meses?

Sou uma candidata a esse acontecimento. Eu percebo: a dada altura é uma pessoa em dois corpos.

 

(...) 

Sabe que não olho para si como uma política?

Não? [gargalhada] Não me levam a sério!

 

Olho para si como alguém que ocupa cargos de chefia nestas áreas, que são as suas. Não estou a dizer que não seja competente politicamente, mas parece que isso não potencia o que melhor que há em si. Comose essa não fosse...

A minha pele, a minha pele... Isso é interessante.

 

 

**

Nada me faltará 

MARIA JOSÉ NOGUEIRA PINTO Jurista 

  

Acho que descobri a política - como amor da cidade e do seu bem-em casa. Nasci numa família com convicções políticas, com sentido do amor e do serviço de Deus e da Pátria. O meu Avô, Eduardo Pinto da Cunha, adolescente, foi combatente monárquico e depois emigrado, com a família, por causa disso. O meu Pai, Luís, era um patriota que adorava a África portuguesa e aí passava as férias a visitar os filiados do LAG. A minha Mãe, Maria José, lia-nos a mim e às minhas irmãs a Mensagem de Pessoa, quando eu tinha sete anos. A minha Tia e madrinha, a Tia Mimi, quando a guerra de África começou, ofereceu-se para acompanhar pelos sítios mais recônditos de Angola, em teco-tecos, os jornalistas estrangeiros. Aprendi, desde cedo, o dever de não ignorar o que via, ouvia e lia. 

 

Aos dezassete anos, no primeiro ano da Faculdade, furei uma greve associativa. Fi-lo mais por rebeldia contra uma ordem imposta arbitrariamente (mesmo que alternativa) que por qualquer outra coisa. Foi por isso que conheci o Jaime e mudámos as nossas vidas, ficando sempre juntos. Fizemos desde então uma família, com os nossos fi- Ihos - o Eduardo, a Catarina, a Teresinha - e com os filhos deles. Há quase quarenta anos. 

 

Procurei, procurámos, sempre viver de acordo com os princípios que tinham a ver com valores ditos tradicionais - Deus e a Pátria -, mas também com a justiça e com a solidariedade em que sempre acreditei e acredito. Tenho tentado deles dar testemunho na vida política e no serviço público. Sem transigências, sem abdicações, sem meter no bolso ideias e convicções. 

 

Convicções que partem de uma fé profunda no amor de Cristo, que sempre nos diz - como repetiuJoão PauloII -"não tenhais medo". 

 

Graças a Deus nunca tive medo. 

 

Nem das fugas, nem dos exílios, nem da perseguição, nem da incerteza. Nem da vida, nem na morte. Suportei as rodas baixas da fortuna, partilhei a humilhação da diáspora dos portugueses de África, conheci o exílio no Brasil eem Espanha. Aprendia levar a pátria na sola dos sapatos. 

  

Como no salmo, o Senhor foi sempre o meu pastor e por isso nada me faltou -mesmo quando faltava tudo. 

  

Regressada a Portugal, concluí o meu curso e iniciei uma actividade profissional em que procurei sempre servir o Estado e a comunidade com lealdade e com coerência. 

 

Gostei de trabalhar no serviço público, quer em funções de aconselhamento ou assessoria quer como responsável de grandes organizações. Procurei fazer o melhor pelas instituições e pelos que nelas trabalhavam, cuidando dos que por elas eram assistidos. Nunca critérios do sectarismo político moveram ou influenciaram os meus juízos na escolha de colaboradores ou na sua avaliação. 

  

Combatendo ideias e políticas que considerei erradas ou nocivas para o bem comum, sempre respeitei, como pessoas, os seus defensores por convicção, os meus adversários. 

 

A política activa, partidária, também foi importante para mim. Vivi-a com racionalidade, mas também com emoção e até com paixão. Tentei subordiná-la a valores e crenças superiores. E seguir regras éticas também nos meios. 

 

Fui deputada, líder parlamentar e vereadora por Lisboa pelo CDS-PP,e depois eleita por duas vezes deputada independente nas listas do PSD. 

 

Também aqui servi o melhor que soube e pude. Bati-me por causas cívicas, umas vitoriosas, outras derrotadas, desde a defesa da unidade do país contra regionalismos centrífugos, até à defesa da vida e dos mais fracos entre os fracos. Foi em nome deles e das causas em que acredito que, além do combate político directo na representação popular, intervim com regularidade na televisão, rádio, jornais, como aqui no DN. 

 

Nas fraquezas e limites da condição humana, tentei travar esse bom combate de que fala o apóstolo Paulo. E guardei a Fé. 

 

Tem sido bom viver estes tempos felizes e difíceis, porque uma vida boa não é uma boa vida. Estou agora num combate mais pessoal, contra um inimigo subtil, silencioso, traiçoeiro. Neste combate conto com a ciência dos homens e com a graça de Deus, Pai de nós todos, para não ter medo. E também com a família e com os amigos. Esperando o pior, mas confiando no melhor. 

 

Seja qual for o desfecho, como o Senhor é meu pastor, Nada me faltará.

 

 

Lá fora: (12-1)
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Terça-feira, 28 de Junho de 2011

.Revista de Imprensa

Nada a fazer, este senhor mexe comigo.

 

 

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Sexta-feira, 27 de Maio de 2011

.Revista de Imprensa

Os custos do amor

por Miguel Esteves Cardoso, Jornal Público

 

 

Helena Sacadura Cabral. "Em quem eu voto é o grande segredo da minha vida"

por Vanda Marques, Jornal i

O pré-aviso chega por telemóvel: Helena Sacadura Cabral não se sente muito bem. Na manhã da entrevista a tensão arterial rondava os 19 valores, efeitos do calor e da campanha eleitoral, deduzimos. Mesmo assim não desmarcou a entrevista. Íamos preparados para receber uma quota mais reduzida de gargalhadas e um sentido de humor mais contido. A escritora, pilota de aviões, economista, professora, e mãe dos políticos Miguel e Paulo Portas, provou que estávamos errados. Numa conversa sem tempo limite falou dos livros, dos filhos, da economia e da herança de Pedro Álvares Cabral.

 

Tem mais um livro novo.

Vocês devem pensar que estou transformada numa fábrica de fazer livros. Em oito meses foram cinco ou seis já nem me lembro. Vou lhe explicar. Quando tive conhecimento da doença do meu filho mais velho [Miguel Portas, que foi operado a um cancro no pulmão] julgo que teria duas possibilidades de me aguentar firme. Uma seria tomando os dispositivos clínicos necessários, tranquilizantes e isso, outra seria embrenhar-me no trabalho que é sempre uma cura vital. Portanto, embrenhei-me no trabalho. Como sou economista, o custo-benefício de gastar dinheiro em medicamentos sem garantias, não compensava. Depois achei que a família ia precisar que eu estivesse, como estou sempre, forte e resistente. Aqui tem a razão para ter publicado tanto.

 

No livro "Caminhos do Coração" mistura viagens verdadeiras com ficção. Foi fácil?

Devo dizer, isto é uma vergonha mas é a verdade, que nunca tive o drama da folha branca. Naturalmente o que eu escrevo não presta para nada e talvez seja rigorosamente isso. Quando me meto ao computador desaparece o que tenho à volta. Nem sequer altero muita a escrita que é bem coloquial. O meu interesse é ser percebida. Não pelos intelectuais que não me encantam particularmente.

 

Porquê?

Acho que olham muito para o seu umbigo. Falam de um povo que não conhecem, com quem não falam, que só olham através de estáticas. Eu sou portuguesa ferrenha e divirto-me a ver as pessoas a conversar na esplanada, no eléctrico, são a marca do povo a que pertenço. Os políticos, como é público, não me interessam particularmente, o discurso deles menos um pouco. O que me interessa é fazer-me entender por pessoas que vivem experiências novas com o que eu escrevo ou que reconhecem os seus problemas, experiências, nas minhas. Ainda hoje tive uma senhora escreveu no meu blogue: "Leio o que escreve quando estou muito em baixo e isso ajuda-me".

 

Escreve sobre coisas tão diferentes como receitas e menopausa. Como decide?

São as coisas que eu gosto e estou me borrifando. Se fosse intelectual é que tinha de me tornar especialista de alguma coisa. Assim não. Tanto me faz que me conheçam como cozinheira, que sou boa, como cronista, que não sou má, como contista, que sou aceitável, ou como prosadora poética, que também sou. Pelo menos não me podem acusar que faça boa vida porque a faço a trabalhar.

 

(…)

Sempre quis escrever?

O meu pai tinha uma mania excelente quando eu tinha uns 10 anitos. Mandava-me subir para um banco, olhava para o relógio e dizia: "Tens cinco minutos e vais falar sobre um tema. Por exemplo, o sol". Isso deu-me uma enorme vantagem em relação às aulas. Ter um anfiteatro cheio de alunos ou com dois era igual. O primeiro livro que eu li foi o dicionário do Torrinha e o meu pai disse-me: "Vais pôr uma cruz em todas as palavras que desconheces". Como deve calcular estava cheio de cruzes. Esses exercícios deram-me uma enorme facilidade para escrever e falar. Não tenho dificuldade nenhuma a comunicar e pus isso a render. Na economia mais simples e nas coisas do quotidiano.

 

(…)

Com dois filhos políticos, nunca lhe passou pela cabeça entrar na política?

Na política? Tá doida? Sou uma criatura de Deus, sou uma criatura com juízo.

 

Porque não?

Acho que o poder exacerba o que as pessoas têm de menos bom.

 

Em todos os casos?

Não em todos, mas exercício da autoridade é a mais dolorosa das experiências. Chefiei pessoas e sei o drama de poder ser injusto, de não ter a certeza porque é que um aluno bloqueou, porque é um funcionário do Banco de Portugal não produziu. A autoridade não é simpática. Nem para as crianças. As mães às vezes têm de magoar um filho para ele crescer. Lembro-me que o Miguel era tremendo, nunca aprendia o "Não toca na tomada", "Não toca no aquecimento". Gostava de desafiar. Um dia eu disse-lhe: "Então dá cá o dedinho". Coloquei-o na ficha e ele: "Aiii". Mas continuava a testar. Gostava de se aproximar para ver se eu reagia. Coitadinho do Miguel, não foi uma criança fácil.

 

(…)

Divorciou-se de Portas e voltou a casar-se mas disse que teve os filhos com quem queria ter?

Nem nunca me passou pela cabeça ter filhos que não fosse do Portas.

 

Porquê?

Porque era o homem da minha vida e tem-se filhos do homem da nossa vida. Não se anda por aí a fazer filhos. Podemos dar uma volta com o vizinho, mas não ter filhos.

 

(…)

Lá fora: "E quem é que não gosta de ti?"
Segunda-feira, 11 de Abril de 2011

.Revista de Imprensa

"Os homens precisam de mimo | Liberdade

 

Eu nunca fui lá muito ciumento. Não por me achar detentor de tão espantosas qualidades pessoais que toda a concorrência fica a milhas de distância do meu esplendor (pobre de mim), mas porque na minha modesta filosofia de vida a liberdade é o maior de todos os valores. Esta simples convicção não é apenas uma coisa vagamente teórica – ela tem, pelo contrário, implicações muito profundas na vida de todos os dias.

 

É por eu acreditar na prevalência da liberdade sobre a igualdade que não sou comunista, que tenho em grande conta o mérito e o esforço individual e que me irrita quando o Estado age como se fosse o papá de todos nós. É por eu acreditar na prevalência da liberdade sobre a autoridade que tento que os meus filhos comecem a pensar pela sua própria cabeça e a assumirem as consequências das suas acções o mais cedo possível. E é por eu acreditar na prevalência da liberdade sobre o próprio amor que o ciúme é algo que se pode por vezes sentir ali na zona da barriga mas que a cabeça (a minha, pelo menos) tem o dever de bloquear.

 

Para quem acredita na liberdade acima de todas as coisas, a infidelidade é com certeza extremamente dolorosa, mas não é algo que se impeça. Se a minha excelentíssima esposa saísse de casa para ir rebolar numa cama de hotel com o George Clooney, eu ficaria muito triste, mas não me passaria pela cabeça fechá-la dentro de casa e atirar a chave pela janela (até porque impedi-la de rebolar numa cama com o George Clooney poderia ser considerado um atentado aos direitos humanos). O ciúme é um sentimento profundamente possessivo, e a única liberdade que eu tenho não é trancar a minha mulher na despensa – é pôr-lhe as malas à porta de casa.

 

É certo que se isto fosse assim com toda a gente iria borda fora metade dos episódios de qualquer novela da TVI, feita de ciúmes assolapados, facadas nas costas e carpideiras de coração destroçado. No entanto, eu acredito mesmo que o amor só faz sentido enquanto entrega absolutamente livre de um ao outro. Quando começamos a namorar com alguém abdicamos de parte da nossa liberdade – desde logo, se se acreditar na monogamia, a liberdade de rebolar com o George Clooney, mas também a liberdade de poder dormir atravessado na cama ou de ter exclusividade da sanita –, só que abdicamos dessa liberdade de livre vontade. O amor é isso: dizer livremente "sou só teu"."

 

João Miguel Tavares, Jornalista

Revista Domingo, Correio da Manhã, 03-04-2011

 

 

Lá fora: “A gente vive na mentira / Já não dá conta do que sente / Antes sozinha toda a vida / Que ter um coração que mente”

Estou:
Quarta-feira, 17 de Novembro de 2010

.Copiona [MEC]

Eu e o MEC nem sempre tivemos uma boa relação. Li algumas coisas dele que até gostei, mas no dia em que terminei de ler “O amor é f*****” senti-me defraudada. Esperava mais, melhor, não gostei. As crónicas diárias dele no Público obrigaram-me a fazer tréguas, a pedir desculpa, a fazer as pazes. São qualquer coisa. Chegam a deixar-me arrepiada. Com uma pontinha de inveja-da-boa. Aparece sempre que vejo alguém que tem a certeza que ama, e que não tem medo de o escrever ao mundo. É ao lê-lo todos os dias que lhe perdoo aquele primeiro impacto, que peço desculpa, – talvez ele só o tenha afirmado porque ainda não tinha experimentado nada assim, não tinha amado assim, não tinha sentido vontade de o gritar assim. Sim, o amor pode ser realmente a palavra começada por ‘F’. Mas talvez ele agora acrescentasse: ‘às vezes”. Ou “para o mal e para o bem”. O que interessa é que existe, seja lá ele o que for, como for. O amor. E que há quem ouse escrevê-lo por aí.

Lá fora: “E sentiu escorrer do coração/A humidade quente da loucura"
L. às 12:45
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Terça-feira, 28 de Setembro de 2010

.Copiona [recortes deste dia]

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Apaixonar-se é a ocasião perfeita para se conhecer profundamente

por Francesco Alberoni (Jornalista e sociólogo), Publicado em 28 de Setembro de 2010  | Jornal i

 

Sempre que nos apaixonamos vemos naquele que amamos o reflexo de nós mesmos. Isso é fundamental para o processo de autoconhecimento

 

A pessoa apaixonada sobrevaloriza aquele que ama. Os psicólogos dizem que projectamos os nossos desejos nele e os psicanalistas garantem que voltamos a ser crianças e encontramos no outro os nossos pais. Quando apaixonados, achamos tudo mais bonito, o mundo parece mais colorido e luminoso. Mas o estado de enamoramento não traz apenas ilusão; também traz conhecimento.

 

Só é possível que nos conheçamos a fundo, a nós próprios, através de outro ser humano. Fazemo-lo com os nossos pais, enquanto crianças, mais tarde com os amigos, mas sobretudo isso acontece quando nos apaixonamos. Nessa altura, queremos saber tudo sobre aquele que amamos, estar sempre a seu lado, amá-lo e sermos correspondidos para sempre. Vemo-lo não só como é no presente, mas como foi em criança, em jovem, recuperamos todas as suas experiências - incluindo os seus amores. E o mesmo faz ele consigo.

 

Através dele, portanto, não conhecemos apenas as nossas ambições mas as ânsias, as qualidades, as virtudes e as debilidades, os seus erros e o seu potencial escondido; como um realizador que sabe logo à partida a grande actriz que tem na sua frente, apesar de apenas ver uma menina inocente.

 

Mas este extraordinário processo de conhecimento apenas é possível com duas condições. A primeira é que cada um, ao contar a sua vida, diga a verdade. Só aquele que é sincero sobre o seu passado abre o seu coração e a sua alma ao outro e pode com ele fundir-se sem perder a própria identidade. A outra condição é a liberdade. Cada um deve ser livre para se exprimir, livre para dizer aquilo que lhe agrada no outro e aquilo de que não gosta.

 

O estado de paixão é uma grande oportunidade para nos conhecermos a nós próprios e aos nossos desejos em profundidade, sem sermos esmagados ou limitados por limites, vínculos, tabus e hábitos que nos refreiam. Apesar de tudo, muitas pessoas não têm coragem de deixar-se emergir no mais profundo do seu ser, inibem-se, calam-se ou mentem, ou mostram apenas os aspectos que julgam que vão agradar ao seu amado.

 

É porém a procura contínua do conhecimento recíproco que faz durar o amor. Porque o ser humano tem mil características, mil potenciais, e quando o libertamos dos travões, floresce de autoconfiança e cada novo encontro torna-se algo diferente e surpreendente. Compararia os apaixonados a dois artistas que tiram milhões de fotografias um ao outro, recuperando ora imagens diferentes do seu amado ora de si próprios. Imagens que são produto da sua imaginação mas, em simultâneo, são reais. É assim o conhecimento do amor, assim, tão parecido com a arte.

 

CRÓNICA DIA-A-DIA

Hugo Gonçalves, Publicado em 28 de Setembro de 2010  | Jornal i

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

 

  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Lá fora:

 

“Why don't you love me? / (…) when I make me so damn easy to love / Why don't you need me? / (…) when I make me so damn easy to need / (…) Maybe you're just not the one / Or maybe you're just playing dumb.”

"Não mereço uma oportunidade?"

Terça-feira, 14 de Setembro de 2010

.Copiona [Sal]

Durante muito tempo o meu estado no email resumia-se a “Diz que tenho sal”. E foram muitas vezes que me perguntaram o significado daquilo. A frase foi copiada de uma música dos Perfume. Achei que fazia todo o sentido. Quando era mais pequena, numas férias de Verão, li o livro "Leandro, Rei da Helíria", de Alice Vieira, e foi só aí, nas palavras de Violeta, que definiu o amor ao pai assim "– Preciso tanto de vós… como a comida precisa do sal", que percebi a importância do sal. Talvez agora, nesta nova fase, tenha percebido ainda mais. O sal é essencial. Tê-lo, vê-lo, senti-lo, percebê-lo, doseá-lo, usá-lo. Que alguém reconheça o nosso, que perceba que em nós há alguma coisa que pode dar mais sabor aos dias que vêm um atrás do outro, é tão bom. Que o digam é ainda melhor.

 

Hoje estou assim, outra vez, copiona.

 

Aqueles que não têm paixões fortes estão condenados a uma vida sem sal

por Francesco Alberoni (Jornalista e sociólogo), Publicado em 14 de Setembro de 2010  |  Jornal i

 

A mudança, a inovação, a criação amadurecem sempre e necessariamente no sofrimento, no desconforto, na solidão

 

A criatividade e o poder inventivo passam sempre por períodos de crise, durante os quais questionamos tudo, até nós próprios. No recente filme de Aronofsky, "The Black Swan" ("O Cisne Negro"), a bailarina é tecnicamente perfeita, mas para atingir a verdadeira perfeição tem de viver uma crise profunda, sair de si, enfrentar o sofrimento, morrer e renascer.

 

Na realidade, todos nós enfrentamos esse problema desde a infância, quando a professora nos questiona. Muitos pedagogos são contra os exames de avaliação porque dizem que estes causam traumas. E é verdade que os provocam, porém, são também imprescindíveis - desde logo porque nos levam a questionar o que queremos para nós e a tomar consciência daquilo que fazemos.

 

Mas há aquele tipo de pessoas que durante o decorrer da sua vida não alteram a sua forma de pensar, a sua maneira de sentir, por vezes nem mesmo mudam de emprego. Vivem uma vida prudente, onde tudo o que acontece está absolutamente controlado, sem riscos e sem imaginação, na qual a necessidade de emoção e de paixão são satisfeitas apenas pela música que ouvem na discoteca ou pelo que fazem quando se juntam às suas claques desportivas.

 

Este tipo de pessoas, façam o que quer que façam - o funcionário vulgar, o filósofo, o político -, não conseguem criar ou inventar nada.

 

A mudança, a inovação, a criação amadurecem sempre e necessariamente no sofrimento, no desconforto, na solidão. A rapariga que não suporta viver no pequeno país onde se sente uma prisioneira, em determinada altura rebela-se, foge, deita tudo ao ar e arrisca-se a ser destruída. Mas só escolhe o risco porque sabe que através dele pode renascer.

 

O cientista que segue um caminho totalmente novo e consegue destacar-se dos outros é por eles ridicularizado e só depois de muitos anos os vê admitir que afinal tinha razão. Da mesma forma que o líder político ou religioso que cria um movimento suficientemente forte para ser capaz de conferir aos que o seguem a força para se rebelarem, assim como dignidade e objectivos começa sempre por ser ridicularizado. Mas só será capaz de o fazer se esse desespero, essa ruptura, essa revolta tiver começado dentro de si próprio.

 

As biografias dos grandes homens da história deixa-nos muitas vezes chocados porque nelas encontramos alterações imprevisíveis de personalidade que parecem tocadas de loucura.

 

A determinada altura, Newton cansou-se da física e decidiu dedicar-se à astrologia e sair em perseguição dos burlões de ocasião. Galileu, que sempre foi um rebelde, provocou deliberadamente todos os antigos e tudo quanto estava instituído ao escrever o "Diálogo sobre os Dois Principais Sistemas do Mundo". Goethe, Lawrence e Nabokov deixaram os amigos desconcertados ao escreverem obras revolucionárias muito tardiamente, mesmo antes de morrerem, como uma espécie de libertação final nas inibições que os prendiam.”

Lá fora: "(...) vem colorir solar"

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