Terça-feira, 16 de Março de 2010
Era suposto ter tirado umas férias do blog. Fechar para balanço. Fazer aquilo que toda a gente faz quando o ano muda e eu me recusei a fazer. Achei que esta era a altura certa para estabelecer prioridades, definir objectivos, interpretar sentimentos, aprender a falar sobre eles e não a escrever apenas. E até estava a correr bem. Até ontem. Porque tive um acidente.
Foi mais ou menos à hora do lusco-fusco. Ali, quando se decide entre o dia e a noite, também eu mudei uma data de opções. Vou à aula, não vou; vou nesta fila, faço um desvio; vou ver não sei quem, não vou ver; páro para comer, como depois. Todas estas questões tiveram resposta no momento do embate. “Bateram-te?”, dizem-me sempre que começo a contar. Não, eu é que fui a má.
Estava na fila há já um bocado. A achar piada à matricula do carro que seguia em frente, ZR, e a fazer o zapping habitual, sem esquecer o espaço de segurança. E depois não sei bem como, o tapete enrolou-se nos meus pés e não achei o travão. E lá fui eu, a ver que ia bater sem conseguir fazer nada. A minha sorte nestas coisas é que estou sempre parada, ou quase. E fui muito crescida. Na hora. Porque não chorei nem liguei a ninguém a não ser quando dei conta que não encontrava o colete, escondido numa gaveta secreta.
Acho que nunca tinha dito tantas vezes a palavra ‘desculpa’. Com os pedidos de desculpa, ia-lhe dizendo que era uma pessoa muito má. Até que terminámos as duas a rir, enquanto preenchíamos a declaração amigável com a caneta que ganhei por me tornar dadora de medula na semana passada e tentávamos desenhar o embate. Foi quando eu olhei para baixo do carro dela – que até então pensávamos que só tinha ganho um arranhãozito ligeiro, que vi qualquer coisa a pingar e pensei que fosse combustível. E foi aí que ‘panicámos’. Chamámos o reboque, eu passei-lhe o meu telemóvel para as mãos, e decidi que ficava ali com ela, que também não gostava nada que me deixassem sozinha na beira da estrada em pleno lusco-fusco (que já se tinha decidido, entretanto, pela noite). Além do mais, eu é que tinha sido a má. A estraga tardes e carros.
E entrámos para o meu carro. Ficámos à conversa ainda um bom bocado. Falámos sobre o embate, os carros, os contactos, o trabalho, o TagusPark. Coisas da vida. Foi quando o reboque chegou. E nos rimos um bom bocado com o sr.. Parece que o carro da moça estava a armazenar água na zona do pneu suplente, que, com o embate, saiu. E pronto, era só isso. Entretanto, eu disse qualquer coisa e o senhor responde: “mas tiveram um acidente?”. Sim, fui eu a má, a que bati, só fiquei para fazer companhia. “Veja lá que eu desde o início estava a pensar que eram amigas e que só tinha vindo para ajudar. Isto não é normal. Devia ganhar um prémio de boa pessoa”. E rimos os três, enquanto falávamos num jantar a 15 de Março de 2011 para comemorar a “batidela”. Despedimo-nos, com promessas de voltar a falar e a lamentar que, com tanta coisa em comum, tivesse de ser um embate a fazer com que nos conhecêssemos.
Entrei no carro e senti o peso do volante. Estava na hora de ligar aos pais. E de chorar um bocado (tu choras por tudo, diz-me o C.). Os homens da minha vida utilizaram o mesmo disco: são coisas que acontecem, de que cor era o pára-choques dela?, às tantas ainda te utilizou só para ter uma pintura nova, e o travão de mão?, choraste muito?, quer dizer que lhe arranjaste o carro e ainda vais pagar?, deixaste a rapariga ligar do teu telemóvel e ainda lhe ofereces boleia?, mas tu conhecias a rapariga de algum lado?, mas tu não mudas?. E eu respondi a tudo com muita força e certeza, que não queria que eles me (ou)vissem de lágrima no canto do olho. Que sim, desde lá de trás que eu tinha percebido que o carro me estava a fazer olhinhos, a implorar para que eu lhe batesse porque precisava mesmo de um pára-choques novo ou de uma pintura, e foi aí que o mundo o ajudou e conspirou a favor dele, me enrolou o tapete debaixo dos pés e me bloqueou o cérebro.
Fiz-me à auto-estrada, sem passar na via verde para não dar mais despesa, enquanto espreitava um bocadinho para me encaixar. Só o encontrei mais à frente, quase em casa. Encostei, descalcei-me, sentei-me à índio, chorei um bocadinho ao som da minha música preferida do momento e só ao fim de uns minutos – o tempo suficiente para pedir ovos mexidos e chocolate –, me fiz à estrada, enquanto via as mensagens e os telefonemas da malta da terrinha tão pouco tempo depois de ter contado apenas aos papás.
Cheguei a casa com uma vontade doentia de escrever. Acabei por adormecer no sofá, sem falar, sem escrever. Nem a passagem para a cama às tantas da manhã interrompeu os meus pesadelos: vivi vezes sem conta o meu embate a dez à hora, aqueles segundos em que percebi que ia bater e não consegui fazer nada.
Quando acordei percebi: nada de férias, nada de balanços. Nada de interpretar sentimentos ou sinais longe daqui, desta folha em branco. Nem de tentar descortinar porque tive de bater num ZR para perceber isso. Porque, entendi agora, talvez nunca consiga exprimir-me de outra maneira que não esta, com palavras-dos-dedos.
Lá fora: "Tu és a pessoa que eu escolhi para me dedicar."
Estou:
Quarta-feira, 24 de Fevereiro de 2010
Tenho medo de matar alguém. Escrito assim pode parecer assustador. E é. É um dos meus maiores medos. Por mais que pense, acho que nunca vou encontrar motivo suficiente para o fazer de livre e espontânea vontade. O meu medo é matar alguém sem querer. Fico mal só de pensar nele.
A morte afecta-me de uma maneira muito estranha. Mesmo quando não conheço, mesmo quando não passam de uma foto num jornal, de um fragmento de conversa que apanho. Leio, oiço aquelas histórias mais que uma vez, tentando apanhar tudo: aquela vida tem de valer a pena e tem de ser contada, não pode passar pelo mundo sem marcar alguém. É por isso que tirar a vida de alguém sem querer é o meu maior medo. Custa-me pensar que posso acabar com uma história, com tantas outras ligadas a ela. E é um sentimento de culpa tão grande, que ainda que seja hipotético, chega a fazer doer.
Hoje vim de carro. Por vontade da minha mãe, vinha sempre que tenho aulas – chegas mais cedo, não é tão perigoso. Mas assim ia perder a magia dos transportes públicos e dos dias especiais, por serem raros, em que trago o carro. Nesses dias, partilho um estranho ritual com o ABel: esqueço que os outros carros têm pessoas lá dentro e canto, com dança à mistura, como se o mundo se resumisse a nós os dois e ao som das colunas. Normalmente desperto deste estado quando reparo que alguém está a olhar para mim ou a rir. Volto à realidade mas só por instantes, até que uma boa música me faça esquecer outra vez o mundo lá fora. Hoje estava num desses meus momentos, a 50 à hora por estar numa localidade (e por ter uns cinco camiões à minha frente), quando apanhei um grande susto. O puto que ia na berma de bicicleta, aos ziguezagues, estampou-se mesmo ali ao meu lado. E eu fiz logo o filme todo nos instantes em que ele ainda não tinha chegado ao chão: ia matá-lo, ia bloquear, ia ser presa, ia viver para sempre com um sentimento de culpa horrível, ia parar para ajudar qualquer que fosse o estado do moço. Encostei um bocadinho à frente e saí do carro com muita vontade de gritar com ele. Dizer-lhe muitas coisas: que a estrada era um sítio muito sério para brincar, que podia ter morrido, que me ia matando a mim de susto, que uma data de coisas. Mas ele não parava de rir e de pedir desculpa, apesar dos joelhos e dos braços cheios de sangue. Perguntei se queria que o levasse ao hospital. E ele responde-me: “de Vila Franca? Só pode estar a brincar”. E foi aí que eu comecei a rir também.
O Rui, que é assim o nome dele, disse-me que estava apaixonado. Que era nisso que estava a pensar quando perdeu o rumo da bicicleta. E que estava a rir porque tinha sobrevivido para mais um beijo logo à noite. E que nos instantes em que estava no ar só pensava na sorte que tinha por ter tido coragem de roubar um beijo à Marta ontem à noite. Que precisava dela. E eu esqueci-me por instantes do medo que me fazia um aperto no peito, das análises por levantar, da Li. que me esperava no caminho e do trabalho. Sentei-me no chão ao lado da bicicleta caída, com o ABel ao meu lado de piscas ligados, sem pensar que estava a sujar o meu casaco preto, e a agradecer à minha cabeça por me ter lembrado de comprar toalhetes ontem. Não devo ter estado ali mais de cinco minutos. O tempo suficiente para que ele se limpasse, o sangue parasse de correr, e eu me apaixonasse pela história do Rui e da Marta.
Ainda ontem dizia isto a alguém, que o mais importante é que precisem de nós. Sentir que fazemos falta, que somos aceites, que precisam de nós para qualquer coisa, pequenina que seja. O Rui precisa da Marta. E eu precisei do Rui para iluminar a minha manhã. Ainda que me tenha feito pensar nos meus medos e dizer muitas asneiras-pequenas-e-grandes.
Ofereci-lhe boleia para qualquer lado, enquanto na minha cabeça ouvia a minha mãe dizer-me “tu és um perigo porque não tens medo das pessoas, foste sempre assim, não pões mal em nada”, e a minha irmã com a sua teoria dos cromos “só tu para quase atropelares alguém e a pessoa começar a falar da vida amorosa”. Mas ele não quis a minha boleia. Fiz-me à estrada depois de o ver partir na bicicleta, quase tão arranhada quanto ele. A sorrir, aos ziguezagues. Da pancada na cabeça ou do amor. A pensar na Marta, pensei eu. E não pude deixar de sorrir também.
Lá fora: "So your face was a light that kept me saved from the dark"
Estou:
Sábado, 20 de Fevereiro de 2010
Encontro de Janeiro, restaurante "Fenícios"
Queria escrever qualquer coisa bonita. Passar para esta página em branco tudo o que a noite de ontem significou. Queria pegar nas minhas palavras mais perfeitas e contornar-vos com elas. Mas às vezes as palavras não são suficientes e nem sempre me saem dos dedos.
Ontem a palavra de ordem foi recordar. O passado. As conversas. Os caminhos. Os erros. As escolhas. Os momentos.
A Nês vem a Lisboa, vamos jantar? O Lucca está fechado, vamos experimentar o La Finestra? Festa na faculdade ou só um barzito? A estas perguntas respondemos em longas conversações no gmail. Eu sou sempre a Maria-vai-com-as-outras: concordo com tudo, digo, mesmo quando à conversa vêm muitas sugestões.
Dei voltas pelo Alegro enquanto esperava que a Nês terminasse as coisas da vida de crescida. Depois apanhei-a e recordámos os caminhos que fazíamos para o emprego que partilhámos, o supermercado onde fazíamos as compras à hora de almoço, o croissant de ovo igual ao da faculdade, as risotas que saíam enquanto eu tratava de reclamar com todos os outros condutores.
Estacionámos em frente ao chinês da faculdade, ao lado do Pato Real que ganhou destaque no nosso hino, em frente aos muros que um dia abrigaram gritos de revolta e que agora são só brancos. Trocámos segredos de maquilhagem enquanto obrigávamos as borbulhas e as olheiras a esconderem-se. E depois foi só esperar pelo resto da malta, embaladas pelo chá preto com limão e canela e a pasta de azeitona.
Pronto, vou contar-vos. Esta é a frase que mais se ouve à nossa mesa. Choramos, rimos, fazemos caras de espanto e olhares que só nós percebemos. Se uma faz asneira, há sempre quem repreenda e quem mostre o lado bom da coisa. Se outra acha uma coisa realmente boa, há sempre alguém para empurrar até à realidade. Ali, onde nos atropelamos para contar os dias em que o tempo nos leva para longe, não é só o jantar das amigas que acontece. Chamar-lhes-ia pequenos milagres. Pequenas catarses.
Deixámos a mesa do restaurante e partilhámos uma daquelas em que os nossos joelhos se tocam. E deixámos o tempo de lado, sem lhe dar contas, e partilhámos as coisas que só ali fazem sentido.
Gosto de nos ver a andar na rua. Porque quando vamos ali as quatro, lado a lado, tão diferentes da cabeça aos pés, consigo imaginar-me do outro lado a ver-nos a andar em passo seguro, de sorriso nos lábios e música de fundo. E esta é uma imagem que não tem palavras à altura.
Pensamos em frio e em sofás de três mil euros quando isso não é o mais importante. Damos por nós em mesas cheias de folhas porque o nosso instinto se deixa enganar no caminho. Paramos em sítios escuros no caminho para casa. Percebemos que já não temos a mesma pujança de ontem. Que não estamos dispostas a algumas experiências. Que nos acomodamos vezes de mais. Que arriscamos de mais também. Mas, percebemos também, somos as mesmas quatro de sempre. As das escadas da FCSH daquele primeiro dia. A da flor no cabelo. A da madeixa branca na testa. A menina da pele transparente. E a dos óculos diferentes. Que não importa se à mesa temos calzone ou humus, do que vimos cheias nestes dias é de amizade.
Queria utilizar palavras bonitas para dizer-vos tantas coisas. Dizer que foi bom beber aquela coisa com cafeína pela primeira vez convosco. Que cantei muito com o ABel até casa pelo escuro da noite. Que não me enganei e dei o toque para o telemóvel certo ao chegar. Que é bom partilhar esta coisa estranha de nos conhecermos tão bem umas às outras que nos chegamos a adivinhar. E que até temos medo de olhar olhos nos olhos em certos dias com medo que nos descubram. E pedir desculpa pelas coisas que às vezes ainda ficam por dizer. Mas as palavras bonitas às vezes não passam disso mesmo. De palavras bonitas. Muitas vezes ocas. Restam-me as sinceras. Não vale a pena inventar outras quando algumas que existem são tão perfeitas e tão cheias. Quando as já inventadas nos cobrem, às quatro, tão bem como uma segunda pele ou o nosso melhor vestido dos saldos. Amizade. Partilha. Cumplicidade.
Estou:
Lá fora: “Qtas x vais ser tu capaz/Fazer sair quem por engano entrou"
Quarta-feira, 20 de Janeiro de 2010
.Pela segunda vez na minha vida, fui à medicina no trabalho. O médico era o mesmo de há dois anos atrás. Recebeu-me com dois beijinhos e com os meus exames na mão. Que eu estava perfeita. Nada a registar no electrocardiograma , “como vê aqui não tem problema nos eixos, na urina nada a registar – deu tudo negativo, e vê muito bem, caso continue a usar os mesmos óculos. Para a sua altura tem pouco peso”. Eu ri – todos os dias a lutar contra a balança e afinal estou magra. “Mas isso sou eu que, como pode ver, gosto mais de chicha”. E depois riu ele muito, enquanto eu tentava perceber a resposta. Achei que era melhor falar-lhe das borbulhas que de repente me invadiram a cara como se eu tivesse regressado à adolescência. “Ah, isso é porque a menina está com as hormonas desreguladas”. Mas dá para ver nos resultados? “Não, percebi a olhar para si. E doenças? Nestes dois anos”. Só gripe A. “Ahhhhhh! Que sorte! Já passou!”. É por estas e por outras que só vou ao médico quando estou quase a morrer ou me telefonam a dizer que está na hora.
.No outro dia ligaram-me do dentista do aparelho. O meu dentista é igual ao Richard Gere mas com os dentes mais bonitos. Lembro-me do rosto dele sobre o meu, com dezenas de diplomas por trás, a questionar-me, todos os meses durante dois anos, como é que eu, menina que lhe parecia tão inteligente, queria ser jornalista. Foi uma época boa. Do secundário, dos amigos, da viagem de finalistas (em que os elásticos que brilhavam no escuro me denunciavam nas discotecas), da entrada na faculdade. No telefonema, disseram-me que estava na hora de regressar. Sim, que já passei para os casos perfeitos, mas tenho de voltar para ver se está tudo bem e porque ainda tenho os ferrinhos por trás. E eu tenho medo de regressar lá. Porque me lembra coisas boas e ando com uma veia saudosista do pior que há. Tenho saudades desses tempos e do meu aparelho. De mudar de cor todos os meses e vir a Lisboa só para o fazer. Tenho saudades. Mas talvez sejam das hormonas.
.Durante a minha vida inteira, devo ter dormido até ao meio-dia uma mão-cheia de vezes. Não gosto, estraga-me o dia. Fico com uma sensação de dia perdido. Por isso, mesmo que me deite tarde, o meu despertador natural não me deixa ficar na cama até depois das dez. Por norma, acordo quando a casa ainda está vazia, com o cheiro da noite. Se estou em casa, corro para a varanda e fico ali a ver a lezíria e os carros a passar, enquanto deixo o meu pensamento ir com eles. Se estou no Alentejo, procuro os primeiros chinelos disponíveis, por norma do meu pai, o robe que está mais à mão, normalmente o meu, e corro para a loja. Sem saco, tento equilibrar nas mãos o leite, o pão quentinho o queijo de ovelha que o viajante acabou de deixar. Às vezes, tenho visitas. A M. e o F. telefonam-me e pedem ovos mexidos. E eu tento equilibrar os ovos caseiros que a avó me passa para as mãos enquanto distribuo beijinhos pela loja e conto as novidades da semana. Acordar depois das dez significa perder tudo isto: a manhã, os carros, o pão quente, os miminhos de quem vai buscar o pão. Na sexta-feira cheguei tarde a casa. Foi uma noite de descobertas. Aninhei-me no sofá com o comando da tv cabo na mão até adormecer. O meu despertador chamou-me às onze horas. Fui para a rua ver a chuva cair e atirei do segundo andar um bocadinho de pão para o cãozinho do senhor que vive numa coisa estranha em frente ao prédio. Depois, o sono foi mais forte que eu e voltei a fechar os olhos no sofá. Acordaram-me às três e meia. Que não era hora de dormir, que me levantasse, que não sei que mais. Nunca tinha sentido, em dias assim, aquela vontade de não abrir os olhos, de ficar do outro lado. De continuar ali a sonhar que era uma repórter num sítio longe de tudo. O telemóvel já registava 10 chamadas da minha mãe. Não sei se tinha alertado já a polícia e os hospitais. Mau hábito, disse-lhe eu. Esta coisa de continuar a avisá-los sempre que chego ao trabalho, a casa e a todo lado, talvez já não faça sentido aos 25. E tentei acordar debaixo de um banho quente, com máscaras pelo cabelo e pela cara, enquanto lá fora o mundo estava chateado comigo porque ousei acordar depois dele. Se me tivesse lembrado, talvez justificasse com as hormonas.
.Estou cheia de borbulhas. Muitas. Pareço uma adolescente. Faço máscaras atrás de máscaras sempre que estou em casa e deito-me com a cara cheia de pasta de dentes. Tenho trabalhos de grupo, saídas com as colegas da faculdade e apetite como nunca. Parece que sim, voltei à adolescência. E tenho as hormonas desreguladas.
.O meu pai ligou-me há pouco. Que a minha multa de estacionamento tinha finalmente chegado a casa. Lembrei-o que o dinheiro já estava lá no Alentejo, na nossa latinha, desde o dia em que fui multada porque não queria pensar mais nisso. E lembrei-me do QueijinHo. Companheiro de estrada e de multas, que agora já não é meu.’Ofereci-o’ à minha mana. Agora tenho um ABel, de gente crescida. Porque quero ser adolescente à força mas já não sou.
.Estou cansada. Mas talvez sejam só coisas minhas. Ou hormonas desreguladas.
Lá fora: não oiço a Rádio Cidade...
Estou: