Terça-feira, 3 de Fevereiro de 2015

.A pior do mundo

No sábado, quando íamos dormir, recebi uma mensagem da minha avó. Dizia qualquer coisa como “Falei com a mana e ela disse-me que a pequenita entalou a mão no elevador da escola e meteu a mão na sopa quente”. Olhei para ela, estava bem, tão serena, a dormir, mas não consegui deixar de me sentir a pior mãe do mundo. Aquela mensagem era digna de Segurança Social. E era tudo verdade. E aconteceu tudo comigo. Na quinta feira fui buscá-la ao colégio como faço todos os dias. Subi pelas escadas, soube as novidades do dia, e depois desci pelo elevador com ela e fiz o mesmo de todos os dias: li-lhe a ementa, deixei que ela mexesse nos botões, e no exato momento em que o elevador estava a abrir e eu já com um pé de fora, ela resolveu meter a mão entre as duas metades do elevador que encaixavam uma na outra. Só ouvi o barulho dela a tirar a mão e depois começou a chorar, muito, e a gritar. E passou-me tudo pela cabeça. Que tinha partido os dedos, a mão, eu sei lá. A Dona S. ajudou-me – percebemos que tinha sido um susto. Com a chupeta e o colinho acalmou, vimos que mexia a mão e só tinha a ponta de um dos dedos raspada. Chorei muito depois, agarrada a ela, enquanto a via num soninho descansado. Fazemos aquilo todos os dias. Como é que foi acontecer? Liguei para o Z. e para a minha mãe. Nenhum dos dois atendia. Quando a minha mãe me devolveu a chamada não me ajudou, “Tens de ter cuidado, a menina podia ter ficado sem mão”. Mesmo o que o meu coração de mãe precisava de ouvir. No sábado de manhã o pai levantou-se cedo e nós ficámos as duas a ‘namorar’ na cama. Levantámo-nos às 11:00 e fui logo fazer a sopa para ela. Ficou pronta a tempo do almoço e levei tudo o que precisava para lha dar na sala. Como estava muito quente, levei um pratinho para onde comecei a deitar a sopa, para arrefecer mais depressa. Estava a fazer isto na nossa mesa e ela sentada na cadeira dela, com o tabuleiro a separar-nos. Foi quando ela se esticou, ficou quase de pé na cadeira, e meteu as mãos na sopa acabada de fazer. Choro, muito choro. E água fria, e creme gordo, e depois lá percebemos que estava tudo bem. Nestes dias, não preciso de o dizer, senti-me a pior do mundo. Sempre tão preocupada, tão atenta (pensava eu), com tantos medos, e nem quando estou por perto, nem com ela bem presa no meu colo, a consigo salvar de todos os males. Coisa difícil, esta de ser mãe. A pior de todas, no meu caso.

 

[Entretanto, já chegaste aos 14 meses. E com eles chegou o teu primeiro dente. Fomos hoje à pediatra que riu muito e disse que ia deixar de poder dar-te como exemplo quando chegam lá pais preocupados com bebés de 6 meses que ainda não têm dentes, “olhem que eu tenho aqui uma menina com mais de um ano que ainda não tem nem um”. Aumentaste de comprimento e aumentaste de peso, o que nem sempre é fácil. Continuas meiguinha, sempre a dar beijinhos (ontem na escola foram dar contigo debaixo da cadeira da papa a dar beijinhos ao Xavier, só porque o Henrique não estava, e no dia dos sentimentos foste a mais beijoqueira). Dás muitos aos bonecos, aos livros, e para o ar. Agora já sabes mandar também com as mãos (mandaste os primeiros aos avós, via Skype), e já gostas de dar nas nossas bochechas. Se dás um ao pai, tens de dar um à mãe também (dizem que nisto sais a mim…), e adoras ficar ao meio na cama a fazer festas nos dois ao mesmo tempo. Conversas e cantas muito, e agora tudo é ‘tátá’. O papá, a mamã, as fotografias. De vez em quando lá arriscas imitar-nos, e saem coisas como ‘añana’ (banana), ‘ela’ (estrela), ‘óa’ (Aurora). Continuas bem disposta e a gostar de passear – na nossa ida à Serra da Estrela só reclamaste na hora da comida, e nem te chateaste com as muitas horas no carro. Assim que ouves uma música começas a dançar e a bater palmas. A hora da comida continua difícil – começas logo a dizer que não com o dedito, mas o pai insiste e sabemos que chegou a hora de parar quando mandas para fora. Aí não vale a pena insistir. Até esse momento, o pai distrai-te com o Ruca e com os teus brinquedos preferidos de momento: tachos, panelas, tupperwares, louças (é por isto que as mulheres nunca vão dominar o mundo). Preferes a nossa comida, e ontem já não pegaste na tua sopa depois de veres o segundo prato. Gostas de noodles, ovo mexido, arroz, fiambre de peru e banana. E de tudo o que seja doce (menos xaropes, que continuas a vomitar). Continuas a gatinhar com uma perna debaixo do rabo e a andar só pela nossa mão ou agarrada às coisas. Há três semanas fizeste o teu primeiro galo na escola – testavas o equilibro quando caíste e bateste na quina de um móvel. Ainda se nota. Ainda me dói. Dizem que pode ter interferido com a tua confiança, mas a pediatra diz que é normal os bebés que gatinham de rabo demorarem mais a andar. Agora detestas vestir collants (quando te visto a segunda perna já despiste a primeira…) e mudar a fralda. É preciso dar-te uns 20 brinquedos diferentes para acabar de te vestir. Tens uns olhos lindos (com a cor dos do pai), sempre abertos e atentos. Continuas curiosa com tudo o que te rodeia, principalmente se tiver botões e luzes, como os comandos e telemóveis. Na falta de verdadeiros, tudo te serve de telemóvel, e encostas à tua orelha enquanto arriscas um ‘tá-lá?’. O ‘já-tá’ também é um clássido, e serve para quando o elevador pára ou quando terminas de mamar. Queres mais? Abanas a cabeça, ‘já-tá’. Na hora da sesta adormeces bem, abraçada a nós, a mexer nas nossas orelhas, a fazer-nos festas ou a dar-nos beijinhos. Às vezes despertas, olhas para nós, sorris, dás um beijinho e voltas a dormir. E eu fico tão feliz. À noite é mais difícil – as minhas costas confirmam. As do pai também. Damos-te banho, mama, deitamos-te na tua caminha dentro do saco cama, rezamos, contamos histórias, cantamos, brincas com os bonecos que estão à mão, mexes nas nossas orelhas, no nosso cabelo, dás beijinhos e quando pensamos que estás a adormecer, damos por ti sentada a dizer ‘olá’. Às vezes é preciso repetir os procedimentos muitas vezes. E depois, entre as 02:00 e as 03:00 encontramo-nos para um aconchego. Já cortaste o cabelo, porque a franja já chegava aos olhos, e temos de usar amaciador porque atrás fica tudo emaranhado. Recebemos a tua primeira avaliação da escola – ainda há muitas coisas que não sabes fazer, mas fiquei feliz com a parte dos relacionamentos, em que tiveste tudo ‘sim’: interages com pequeninos e com adultos, partilhas os brinquedos, és meiguinha, és feliz. E isso é tudo o que mais quero na vida, pequena Aurora, que sejas feliz.]

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L. às 16:09
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1 comentário:
De mina jesus a 5 de Fevereiro de 2015 às 16:46
Ri e chorei porque senti saudades e porque te quero dizer que não és nada uma má mãe, mas sim que és igual a todas as outras mães.

Todas as mães do MUNDO teem histórias para contar e há um ditado muito verdadeiro que é o seguinte " ao menino e ao borracho mete DEUS a mão por baixo.

texto muito bom! beijinho

e...... quero mais!

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